Imagem na Igreja de N.ª Sr.ª da Luz, Mindelo |
Exactos 554 anos se passaram sobre a descoberta desse pedaço de terra plantado no Atlântico chamado São Vicente, por ser dia do santo do mesmo nome. E se Nossa Senhora da Luz é a figura religiosa que mais adeptos tem na nossa ilha e se São João é príncipe em época de folguedos na Rubera d'Julion, São Vicente é também santo de grande devoção, nomeadamente entre pescadores e outra gente do mar da ilha do Monte Cara. Hoje é o dia dele e por isso o Praia de Bote aqui deixa a singela homenagem ao santo (biografia e republicação de conto divulgado no post 194, em 29.06.2012 ) que no templo da Pracinha d'Igreja, lá bem alto no lado da Epístola zela pela terra do Monte Cara. Ali, como em Lisboa, cidade irmã e amiga, onde vivem e trabalham tantos naturais da terra vicentina.
São Vicente (texto adaptado da Wikipedia)
Nascimento: século III d.C. em Huesca, Hispânia Tarraconense (Huesca, Aragão, Espanha)
Morte: ca. 304 em Valentia, Hispânia Tarraconense (Valência, Espanha)
Veneração por Igreja Católica; Comunhão Anglicana; Igreja Ortodoxa
Festa litúrgica: 22 de Janeiro na Igreja Católica; 11 de Novembro na Igreja Ortodoxa
Roupas episcopais ou pontifícias; cachos de uva; instrumentos do martírio; palma do martírio
Padroeiro São Vicente, Lisboa; Valência; Vicenza, Itália; São Vicente de Cabo Verde (com palma e um barco); também dos fabricantes de vinagre e vinicultores
Pintura de André Reinoso (séc. XVII), catedral de Lamego, Portugal |
Vida e obras:
Na época do imperador romano Diocleciano, o delegado imperial Daciano moveu na Ibéria uma perseguição aos cristãos. Vicente recusou oferecer sacrifícios aos deuses e foi cruelmente martirizado até à morte, que terá ocorrido em 304.
Em Portugal é representado de modos diversos: com palma e evangeliário ou, mais habitualmente, com uma barca e um corvo, porque, de acordo com a tradição, quando, em 1173, o rei Afonso Henriques ordenou que as relíquias do santo fossem trazidas do Cabo de São Vicente (o então «Promontorium Sacrum»), junto a Sagres, para a cidade de Lisboa, duas daquelas aves velaram o corpo do santo que seguia a bordo da barca – facto a que ainda hoje aludem as armas de Lisboa e de muitas outras povoações portuguesas.
Em França, S. Vicente é padroeiro dos vinhateiros e profissões afins, e porta como insígnias um cacho de uvas, para além da palma do martírio.
A verdadeira, celestial-terrena e até agora desconhecida história do nascimento do Colá Sanjom, na Ribeira de Julião
Como todos sabemos, depois de ter criado o Mundo, Deus sacudiu as mãos da terra que elas ainda continham, atirando-a para um sítio no Atlântico, mais ou menos entre as latitudes 14 e 17 Norte e longitudes 22 e 25 Oeste, perto do continente africano - o que deu dez ilhas, alguns ilhéus e mais umas quantas rochas anónimas. Tratava-se de Cabo Verde. Depois, Deus lavou as mãos nas águas do oceano e esqueceu-se do arquipélago que inadvertidamente tinha criado. Ainda por cima, nem gente lá pôs.
Coube essa tarefa a uns rapazes que da cara da Europa saíram nos alvores do século XV para o Mundo, em busca de comércio, aventura e terras para expandirem o pequeno rectângulo onde viviam. Claro que, a partir daí, os ditos cujos fizeram algumas tropelias. Mas também se portaram com categoria, noutras ocasiões. E numa dessas, em que estavam bem dispostos, após terem chegado às ditas ilhas, criaram o Homem e a Mulher cabo-verdianos, simpáticos seres como não há outros iguais à face da terra... excepto os portugueses, claro está, e talvez os brasileiros! Simpáticos, os ilhéus, porquê? Porque para além dos genes e cromossomas que muitos deles traziam de África, de onde emigraram forçadamente, herdaram dos mondrongue os de árabes, visigodos, celtas, romanos, lusitanos e sabe-se lá mais de quem que os portugas de há muito transportavam no sangue... Concluindo, tudo boa gente! Nem mais!...
Passou o tempo e os portugueses também se foram esquecendo de algumas das ilhas, sobretudo da de S. Vicente, talvez por esta ser uma das mais carecas de vegetação. Até que, para contrariar a incomodativa pirataria que nela de vez em quando se alojava, os lusos acordaram e resolveram povoá-la, quase no final do século XVIII. Segundo rezam as crónicas, vinte casais e cinquenta escravos foguenses, chefiados pelo capitão-mor João Carlos da Fonseca Rosado, natural de Tavira, criaram a pequena aldeia de Nossa Senhora da Luz à qual, o futuro governador Pusich se lembrou de dar em 1819 o estapafúrdio nome de Leopoldina... Graxa, dizemos nós, graxa queria ele dar à família real, pois Leopoldina era a austríaca esposa do príncipe Pedro, então em forçado (e dourado) exílio brasileiro, futuro imperador do Brasil e Rei Pedro IV de Portugal (neste caso, apenas por uma semana)...
Mindelo foi o nome definitivo, liberal e chamativo, que no crioulo da ilha acabou por perder o finalizante "o", ficando ainda mais falável. E a ilha e a cidade foram crescendo, sob a égide de S. Vicente, o santo marítimo do dia do achamento e padroeiro de Lisboa que emigrou para Cabo Verde ao mesmo tempo que os descobridores aproaram ao território. Mas faltava qualquer coisa. Sentia-se uma necessidade de folia que ainda não tinha o Carnaval para ser saciada. Que se poderia fazer, que se poderia arranjar, para a suprir? Foi então que entrou em cena o santo onomástico. Que diabo, afinal era ele o defensor maior da ilha, aquele a quem, em caso de necessidade de qualquer ordem - embora sempre sob a égide de Nossenhora da Luz - competia interceder pelos mindelenses, sobretudo os que se aventuravam no Mar de Canal ou lá longe nos States, na pesca da baleia. Ora o santo, aproveitando um dia em que Deus e S. João estavam a conversar, sentados numa nuvem do quadrante 46898/3 do céu, resolveu falar-lhes no assunto. E foi este, exactamente, sem tirar nem pôr, o teor da conversa tripartida que aqui relatamos:
Disse S. Vicente, ao chegar junto a eles:
- Meu Deus, S. João, bons olhos vos vejam, há que tempos não nos encontrávamos.
- É verdade, Vicente, há muito que não nos vemos. Senta-te aqui nesta confortável ponta da nuvem e diz-me: que tal a tua ilha? Como vai aquele pessoal? - perguntou Deus, mostrando-se interessado.
- Triste, Senhor. Aquilo é muito boa gente, do melhor que há na Terra por Vós criada, mas falta-lhes qualquer coisa, algo que os divirta e lhes dê energias para prosseguirem o dia-a-dia com outro vigor. Eles bem trabalham, coitados, mourejam, tiram das rochas escalavradas e do mar o sustento mas andam sempre abatidos, sem nenhum ligria. Senhor, morabeza ca ta tchegá pa ser feliz (cabe dizer que S. Vicente já arranhava o crioulo...).
- E que achas que se pode fazer? - perguntou João, o santo pastor.
- Sei lá, talvez inventar-se uma festa. Um farra, um fistinha anual, qualquer cosa divertide, pa tude munde fcá filiz, c'um missa, dança, coladera, funaná, pastilim de midge c’pêxe, sucrinha, um grogue… Talvez, tude djunte.
Deus cofiou as longas barbas, pensou, pensou e repensou, e ao fim de mais de meia hora resolveu responder:
- Uma festa religiosa, adoçada com coisas do mundo, queres tu dizer?
- Sim, meu Deus, por exemplo no meu dia – avançou São Vicente, pensando dar mais cor ao seu 22 de Janeiro.
Mas João, sábio e expedito (e um pouco molestado, diga-se), retorquiu logo:
- Meu Deus, acho que aqui o Vicente quer açambarcar tudo. Desde 22 de Janeiro de 1462 que a ilha, mesmo sem gente, comemora o seu dia – que foi o da descoberta. Já lhe chega, acho eu. Bem podia ser no meu, que no Mindelo ainda não tem grande significado. Mas Tu, na Tua imensa sabedoria é que tens a última palavra.
Deus coçou a cabeleira, afagou o bem delineado nariz, olhou para ambos – para o expectante João e para o não menos ansioso Vicente –, espreitou durante uns minutos por um vasto buraco que havia na nuvem e depois de matutar mais alguns uns minutos, disse:
- Tens razão, João, tens imensa razão, como sempre, meu bom amigo. O Vicente já é amado em toda a ilha, até possui uma bonita imagem na igreja de Nossenhora da Luz, de barquinho na mão e tudo, e a ti ninguém te liga, ao contrário do que acontece na terra do dragão, no norte do país dos descobridores, onde até martelinhos em seu nome inventaram e têm um São Jorge Qualquer Coisa da Costa, de carne e osso, para competir contigo. E virando-se para São Vicente, acrescentou: - Bitchenta, tu és bom rapaz, já se sabe, mas agora é a vez do Djon. Estive a observar aquilo lá em baixo e perto do Mindelo está um terreno mesmo adequado para um arraial anual a 24 de Junho: acho que lhe chamam Rbera d’Julion ou coisa parecida, até ali cresce milho quando é época de azágua. Bom sítio para a festa, acho eu, com espaço para as barracas de comes e bebes e para o bailarico. Assim, o Mindelo fica com festa religiosa vicentina, no início do ano, e joanina mista, a meio. Isto, para não falar das restantes como a de Nossenhora da Luz. Contenta-se a santidade toda. Que tal? Que dizes? Achas bem?
São Vicente, que de facto era compreensivo, embora tenha ficado algo triste por perder uma festa que desde logo se afigurava bem divertida, acabou por cedê-la ao companheiro. E logo regressou ao arquipélago, numa longa jornada, desde lá acima até cá abaixo, incorporando de novo a imagem que ainda hoje vemos na igreja matriz do Mindelo, do lado direito ou da Epístola. De modo que foi dali que durante alguns meses inculcou nos fiéis, sem que eles disso se apercebessem, essa ideia que obviamente frutificou e no sítio pretendido, a Rbera. Claro que houve uns quantos exageros picantes na liturgia mundana da festa, como aquel stóra d'“colá Sanjon”, que agora já é impossível remediar, de tão arreigada que está no coração do povo: está feito, está feito. Deus não se tem mostrado preocupado com isso, Sanjon ainda menos e Sanbitchenta, esse continua todos anos à espera do 22 de Janeiro para comemorar com brilhantismo o seu dia e depois sair a correr da igreja da pracinha a caminho do aeroporto Cesária Évora, para apanhar o avião que o levará a Lisboa onde continua a festa, na Sé, à vista do Tejo que faz estrada com o Atlântico e o Porto Grande. E, quando no Verão tem tempo, ainda dá um saltinho ao lisboeta bairro do Alto da Cova da Moura, para ver o amigo Djon que ali também tem poiso certo a 23 de Julho, com homens dançando dentro de barquinhos embandeirados e apitos a soar e tudo…
E aindaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaa!!!... para completar a festa, um muzquinha sabe: Sérgio Godinho e Tito Paris, no disco de SG "O Irmão do Meio", de 2003. Ouvir "Chuvas de Cabo Verde", AQUI
A verdadeira, celestial-terrena e até agora desconhecida história do nascimento do Colá Sanjom, na Ribeira de Julião
Joaquim Saial
Como todos sabemos, depois de ter criado o Mundo, Deus sacudiu as mãos da terra que elas ainda continham, atirando-a para um sítio no Atlântico, mais ou menos entre as latitudes 14 e 17 Norte e longitudes 22 e 25 Oeste, perto do continente africano - o que deu dez ilhas, alguns ilhéus e mais umas quantas rochas anónimas. Tratava-se de Cabo Verde. Depois, Deus lavou as mãos nas águas do oceano e esqueceu-se do arquipélago que inadvertidamente tinha criado. Ainda por cima, nem gente lá pôs.
Coube essa tarefa a uns rapazes que da cara da Europa saíram nos alvores do século XV para o Mundo, em busca de comércio, aventura e terras para expandirem o pequeno rectângulo onde viviam. Claro que, a partir daí, os ditos cujos fizeram algumas tropelias. Mas também se portaram com categoria, noutras ocasiões. E numa dessas, em que estavam bem dispostos, após terem chegado às ditas ilhas, criaram o Homem e a Mulher cabo-verdianos, simpáticos seres como não há outros iguais à face da terra... excepto os portugueses, claro está, e talvez os brasileiros! Simpáticos, os ilhéus, porquê? Porque para além dos genes e cromossomas que muitos deles traziam de África, de onde emigraram forçadamente, herdaram dos mondrongue os de árabes, visigodos, celtas, romanos, lusitanos e sabe-se lá mais de quem que os portugas de há muito transportavam no sangue... Concluindo, tudo boa gente! Nem mais!...
Passou o tempo e os portugueses também se foram esquecendo de algumas das ilhas, sobretudo da de S. Vicente, talvez por esta ser uma das mais carecas de vegetação. Até que, para contrariar a incomodativa pirataria que nela de vez em quando se alojava, os lusos acordaram e resolveram povoá-la, quase no final do século XVIII. Segundo rezam as crónicas, vinte casais e cinquenta escravos foguenses, chefiados pelo capitão-mor João Carlos da Fonseca Rosado, natural de Tavira, criaram a pequena aldeia de Nossa Senhora da Luz à qual, o futuro governador Pusich se lembrou de dar em 1819 o estapafúrdio nome de Leopoldina... Graxa, dizemos nós, graxa queria ele dar à família real, pois Leopoldina era a austríaca esposa do príncipe Pedro, então em forçado (e dourado) exílio brasileiro, futuro imperador do Brasil e Rei Pedro IV de Portugal (neste caso, apenas por uma semana)...
Mindelo foi o nome definitivo, liberal e chamativo, que no crioulo da ilha acabou por perder o finalizante "o", ficando ainda mais falável. E a ilha e a cidade foram crescendo, sob a égide de S. Vicente, o santo marítimo do dia do achamento e padroeiro de Lisboa que emigrou para Cabo Verde ao mesmo tempo que os descobridores aproaram ao território. Mas faltava qualquer coisa. Sentia-se uma necessidade de folia que ainda não tinha o Carnaval para ser saciada. Que se poderia fazer, que se poderia arranjar, para a suprir? Foi então que entrou em cena o santo onomástico. Que diabo, afinal era ele o defensor maior da ilha, aquele a quem, em caso de necessidade de qualquer ordem - embora sempre sob a égide de Nossenhora da Luz - competia interceder pelos mindelenses, sobretudo os que se aventuravam no Mar de Canal ou lá longe nos States, na pesca da baleia. Ora o santo, aproveitando um dia em que Deus e S. João estavam a conversar, sentados numa nuvem do quadrante 46898/3 do céu, resolveu falar-lhes no assunto. E foi este, exactamente, sem tirar nem pôr, o teor da conversa tripartida que aqui relatamos:
Disse S. Vicente, ao chegar junto a eles:
- Meu Deus, S. João, bons olhos vos vejam, há que tempos não nos encontrávamos.
- É verdade, Vicente, há muito que não nos vemos. Senta-te aqui nesta confortável ponta da nuvem e diz-me: que tal a tua ilha? Como vai aquele pessoal? - perguntou Deus, mostrando-se interessado.
- Triste, Senhor. Aquilo é muito boa gente, do melhor que há na Terra por Vós criada, mas falta-lhes qualquer coisa, algo que os divirta e lhes dê energias para prosseguirem o dia-a-dia com outro vigor. Eles bem trabalham, coitados, mourejam, tiram das rochas escalavradas e do mar o sustento mas andam sempre abatidos, sem nenhum ligria. Senhor, morabeza ca ta tchegá pa ser feliz (cabe dizer que S. Vicente já arranhava o crioulo...).
- E que achas que se pode fazer? - perguntou João, o santo pastor.
- Sei lá, talvez inventar-se uma festa. Um farra, um fistinha anual, qualquer cosa divertide, pa tude munde fcá filiz, c'um missa, dança, coladera, funaná, pastilim de midge c’pêxe, sucrinha, um grogue… Talvez, tude djunte.
Deus cofiou as longas barbas, pensou, pensou e repensou, e ao fim de mais de meia hora resolveu responder:
- Uma festa religiosa, adoçada com coisas do mundo, queres tu dizer?
- Sim, meu Deus, por exemplo no meu dia – avançou São Vicente, pensando dar mais cor ao seu 22 de Janeiro.
Mas João, sábio e expedito (e um pouco molestado, diga-se), retorquiu logo:
- Meu Deus, acho que aqui o Vicente quer açambarcar tudo. Desde 22 de Janeiro de 1462 que a ilha, mesmo sem gente, comemora o seu dia – que foi o da descoberta. Já lhe chega, acho eu. Bem podia ser no meu, que no Mindelo ainda não tem grande significado. Mas Tu, na Tua imensa sabedoria é que tens a última palavra.
Deus coçou a cabeleira, afagou o bem delineado nariz, olhou para ambos – para o expectante João e para o não menos ansioso Vicente –, espreitou durante uns minutos por um vasto buraco que havia na nuvem e depois de matutar mais alguns uns minutos, disse:
- Tens razão, João, tens imensa razão, como sempre, meu bom amigo. O Vicente já é amado em toda a ilha, até possui uma bonita imagem na igreja de Nossenhora da Luz, de barquinho na mão e tudo, e a ti ninguém te liga, ao contrário do que acontece na terra do dragão, no norte do país dos descobridores, onde até martelinhos em seu nome inventaram e têm um São Jorge Qualquer Coisa da Costa, de carne e osso, para competir contigo. E virando-se para São Vicente, acrescentou: - Bitchenta, tu és bom rapaz, já se sabe, mas agora é a vez do Djon. Estive a observar aquilo lá em baixo e perto do Mindelo está um terreno mesmo adequado para um arraial anual a 24 de Junho: acho que lhe chamam Rbera d’Julion ou coisa parecida, até ali cresce milho quando é época de azágua. Bom sítio para a festa, acho eu, com espaço para as barracas de comes e bebes e para o bailarico. Assim, o Mindelo fica com festa religiosa vicentina, no início do ano, e joanina mista, a meio. Isto, para não falar das restantes como a de Nossenhora da Luz. Contenta-se a santidade toda. Que tal? Que dizes? Achas bem?
São Vicente, que de facto era compreensivo, embora tenha ficado algo triste por perder uma festa que desde logo se afigurava bem divertida, acabou por cedê-la ao companheiro. E logo regressou ao arquipélago, numa longa jornada, desde lá acima até cá abaixo, incorporando de novo a imagem que ainda hoje vemos na igreja matriz do Mindelo, do lado direito ou da Epístola. De modo que foi dali que durante alguns meses inculcou nos fiéis, sem que eles disso se apercebessem, essa ideia que obviamente frutificou e no sítio pretendido, a Rbera. Claro que houve uns quantos exageros picantes na liturgia mundana da festa, como aquel stóra d'“colá Sanjon”, que agora já é impossível remediar, de tão arreigada que está no coração do povo: está feito, está feito. Deus não se tem mostrado preocupado com isso, Sanjon ainda menos e Sanbitchenta, esse continua todos anos à espera do 22 de Janeiro para comemorar com brilhantismo o seu dia e depois sair a correr da igreja da pracinha a caminho do aeroporto Cesária Évora, para apanhar o avião que o levará a Lisboa onde continua a festa, na Sé, à vista do Tejo que faz estrada com o Atlântico e o Porto Grande. E, quando no Verão tem tempo, ainda dá um saltinho ao lisboeta bairro do Alto da Cova da Moura, para ver o amigo Djon que ali também tem poiso certo a 23 de Julho, com homens dançando dentro de barquinhos embandeirados e apitos a soar e tudo…
E aindaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaa!!!... para completar a festa, um muzquinha sabe: Sérgio Godinho e Tito Paris, no disco de SG "O Irmão do Meio", de 2003. Ouvir "Chuvas de Cabo Verde", AQUI
Bem, já vamos na primeira hora do dia 22 de Janeiro, e sou o primeiro a pisar o chão do adro da Igreja de Nossa Senhora da luz, pronto para a missa, a procissão e tudo o mais que venha a calhar na rede dos nossos pescadores da Praia de Bote. Pronto para o momento solene e interiorizado face ao olhar místico de nhô padre no altar, mas também pronto para toda a espécie de mufneza mal rebentem os foguetes no ar a abrir as hostilidades. Sim, porque no Mindelo é assim mesmo, é essa mescla de bons costumes mas também de desvarios e libertinagem. Sem isso Mindelo não é nada.
ResponderEliminarMas, antes de tudo o mais, felicito o nosso Djack pela sua importante pesquisa hagiológica, fazendo com que todos, fiéis ou infiéis, crentes ou descrentes, incrédulos ou incréus, enriqueçam o seu conhecimento sobre os santos que, a seu jeito, e com duvidosa eficácia, a não ser em dias festivos, abençoam a nossa querida ilha de S. Vicente.
Essa história do Colá Sanjom é um produto de muita imaginação criativa, muito labor, muita rebaldaria e muita pirraça, tudo, com um bom grogue de S. Antão à mistura, formando um cocktail digno de ser bebido neste dia festivo, que, por direito próprio, vai estender-se até 24 de Junho, lá para os lados da Rbera de Julion, mas com capacidade para se transferir para latitudes mais setentrionais, Porto, Lisboa e a outra banda, graças à santificada ubiquidade e omnisciência desses dois guardiães do chão de S. Vicente.
Hoje é um grande dia para S. Vicente. sempre foi. Ainda me lembro da grande festa religiosa que é e era com a magnífica procissão ao qual inúmeras vezes me integrei tanto como anjinho como integrante da massa dos fieis
ResponderEliminarNeste dia não hà ateus, agnôsticos ou não sei que mais. Todos, com os "ratos d'igreja" se d éao as mãos para a ramboia na medida do possivel.
ResponderEliminarOs que estão long podem comemorar com uma cachinha, mesmo de lata.
Braças e mantenhas pa tude gente.
Pesso desculpas. O meu aparelho està maluco e contamina-me. Quiz dizer uma "cachupinha, mesmo de lata".
EliminarGrande texto do Saial dedicado a S Vicente. Um abraço fraternal neste dia de todos os mindelenses
ResponderEliminarÉ com todo o carinho e muita admiração que me associo a este belíssimo trabalho do Djack, saudando todos quantos, ao longo destes muitos anos de vivência caldearam estreitos laços de amizade no amor comum pela terra sagrada e suas gentes sofredoras mas nobres de espírito e coração! Bem hajam!
ResponderEliminarBraça morabe
Zito
Pois, este trabalho do Djack merece o reconhecimento de todos os mindelenses. Tanto que, conforme soube há bocadinho, nhô padre chamou o sacristão e deu-lhe ordem para tirar uma impressão deste texto e afixá-lo à porta da igreja. Dizem que são intermináveis as filas de gente à espera de vez para ler o texto. O Djosa de nha Bia, que é um oportunista sem vergonha, tirou fotocópias que anda a distribuir pelo povo, cobrando 200 escudos por cada exemplar. Nhô padre alertou a polícia pelo facto de o Djosa estar a tirar proveito pessoal de trabalho alheio, completamente nas tintas para os direitos de autor. O guarda Raspa deitou-lhe a mão e agora o nosso Djosa está sentado num banco da Staçom de Pliça à espera de ser ouvido. Entretanto, são incontroláveis as enchentes na Pracinha da Igreja.
ResponderEliminarAcabo de saber que o Djosa está já a ser ouvido e não diz coisa com coisa, tal a fusca que apanhou logo plumanhã. Ele diz e repete sistematicamente: A culpa é do Val que confundiu cachinha com cachupinha, a culpa é do Val que confundiu cachinha com cachupinha... Tanto que o chefe da polícia está a pensar em contactar a INTERPOL para o nosso Val comparecer na Staçom a fim de esclarecer o imbróglio, porque o fio da meada está cada vez mais enrolado. Ao mesmo tempo, o povo está a juntar-se à porta da Staçom, chefiado pela carregadeira de cais Caela, para dar uma sova no Djosa.
ResponderEliminarE o pior nem sequer é isso. Parece que o Djosa está feito com um famoso e estimado fotógrafo da ilha e que foi no estaminé deste, na Rua d'Sanjon, que as fotocópias foram feitas. E as ramificações já chegam a Tours. Sim senhor, a Interpol já está no encalço do galã de Tours que não só está metido neste caso como em vários outros famosos: o da venda de areia de inferior qualidade para a Lajinha, o do roubo de canalizações na Praia de Bote, o da venda de madeira de acácias do Mindelo para concursos do Praia de Bote (o que também implica um reputado coronel que tem quase todo o monopólio de prémios dos mesmos), etc., etc.
EliminarBraça vicentina,
Djack
Acabo de saber que o pessoal da Capitania está a ser mobilizado para dar apoio aos pliças d'staçom, no sentido de se salvar o Djosa de linchamento pela populaça em fúria. Por outr lado, disseram agora que se chegou a pensar que o galã de Tours estava refugiado em Cabo Verde, numa casa de Fonte Cónego. Porém, quando a polícia ali chegou, só encontrou uma garrafa de cognac Napoléon quase vazia e farto sortido de baguettes e croissants, para além de queijo francês, sobretudo Camembert e Roquefort. O galã de Tours tinha entretanto fugido através de uma intrincada rede de túneis que vão dar à Lajinha, de onde fugiu de submarino para Santa Luzia.
ResponderEliminarBraça noticiosa,
Djack
O que não sabes, Djack, é que esse galã diz que troca todas essas iguarias dos franciús por um bom prato de arrozcatum. Ele anda por aí desvairado à procura do Zito. Um moço quis vender-lhe uma robusta lagosta e ele reagiu assim: - Nem por sombras, o que quero é atum e de preferência com arroz semeado nas margens do rio Vouga! Tragam-me uma boa pratada disso! E a polícia que já anda também desconfiada do Zito? Disse o chefe local: Ah, esse fjon tem tucim, qual arrrozcatum, se calhar o que vai confirmar-se é mesmo o ressurgimento dessa nossa antiga rádio. E se for assim, está tudo perdoado: Djosa, Val, Zito, e mesmo essa mulheraça da Caela que invadiu a cadeia e aplicou uma sova de criar bicho ao desgraçado do Djosa.
ResponderEliminarEntretanto, o Djosa continua detido. Agora deu-lhe para dizer: Ê tud culpa daquel trampa mnin busod de Djack de Cuptania. S'un pegal um tá bá ptál na mar li na ponta de cais nov. O chefe de pliça mandou logo fazer uma busca às instalações da Cuptania a ver se descobre o Djack enfiado nalgum cubículo. É que começam a desconfiar que o Djack está por trás de toda uma tramóia montada para o Dia de S. Vicente, depois de lhe ter sido detectada uma comunicação em código com alguém em Tomar. Aonde é que isto já vai!
ResponderEliminarParece que o Marcos Soares foi agora solicitado pela Pliça local para fotografar uma série de vestígios, designadamente as impressões digitais deixadas nas fotocópias do texto do Djack e o esqueleto de um atum encontrado na Chã de Cemitério, atrás da casa onde o Val viveu a sua juventude.
ResponderEliminarSabe-se já que o esqueleto não é de atum mas sim de um japonês de maru que foi apanhado pelo Djosa de nha Bia em flagrante com uma sua namorada, em 1965. O japona, chamado Hayato Kurosima, desapareceu de bordo do Osuru Maru no Carnaval desse ano e nunca mais ninguém o viu, apesar das diligências empreendidas pela Pliça e pessoal d'Cuptania. Sabe-se agora que era de facto o sujeito, devido ao rádio Sony já muito danificado que tinha junto a si e porque as órbitas da caveira eram em bico, quase de tipo marciano de OVNI. Feitas análises forenses, para total confirmação, chegou-se à conclusão de que é mesmo o dito Hayato e até foi possível chegar ao Djosa de nha Bia porque o palerma deixou a navalha enterrada no corpo do morto, a qual ainda estava entre as costelas do mesmo, com a indicação gravada no cabo de osso de cachlote: "Pa Djosa, de sê mamã quirido, Bia". Agora, anda tudo atrás do Djosa...
EliminarCá para mim, só o Djack é de fiar. As calúnias do Djosa de nha Bia não se colam nele, pois ninguém acredita naquele monte de pupu d'Praia de Bote. Mas por outro lado tenho quase a certeza de que o galã de Tours, o Vozinha d'rade e o Djosa Soares estão feitos uns com os outros. O Vozinha d'Rade prometeu arrozc'atum ao galã de Tours até ao fim da vida se ele lhe arranjar 20 quilos de lagosta da melhor. O problema é que o tal rapaz desapareceu e agora é o Djosa Soares que anda metido ao barulho a procurá-lo por tudo que é sítio na ilha, desde Alto de Santo António a Fonte Francês, passando por Salamansa, São Pedro e Baía das Gatas. Acontece que esse rapaz, que pescava lagosta como profissão, agora dedica-se a fazer grogue d'bateria algures em Santo Antão e só vem a São Vicente para vender a mercadoria, de noite e à sucapa. Resumindo, só no bas-fond sabem dele. E bas-fond é com o Djosa de nh Bia, pelo que o Djosa Soares vai ter que lhe dar uns escudos cabo-verdianos para pôr o gajo ta papiá...
ResponderEliminarMas acontece que na sua homilia esta tarde, com a igreja repleta de fiéis e infiéis (até se desconfia de um jihadista lá metido, que abjurou a sua fé depois de rendido a uma crioula), nhô padre resolveu perdoar todos os desavindos e infractores deste dia, a mando de S. Vicente. Quando nhô padre, do alto do púlpito, lhe foi segredado pelo sacristão que o Chefe de Pliça ia perdoar tudo, deu um brado e proclamou alto e bom som: neste dia santo a Pliça não mete o bedelho em assuntos de perdão, isso é coisa fora do seu baralho. Hoje a única entidade que perdoa é S. Vicente, que agora mesmo saiu daqui depois de lavrar a sua sentença. Só fez um reparo: Djosa de nha Bia tem de ficar reduzido à àgua de Madeiral durante 29 dias, 30 minutos e 17 segundos. A seguir a estas palavras, ouviu-se um bruá prolongado dentro da Igreja de Nossa Senhora do Rosário.
ResponderEliminarÓ moce, já bô mtê aga. Nossenhora de Rosário é na Sintantom, na Rubera Grande. Na Soncente é Nossenhora da Luz, na Pracinha d'Igreja (Paróquia de Nossa Senhora da Luz), fora aquel ote nove na Monte Sossego, igreja de São Vicente (Paróquia de São Vicente). Djosa ta podê morrê cum castigue dêss. Um tem pena dele cuitóde... Mas ele ta merecê, desaforode dum raio.
EliminarOh Djack, foi o efeito de um grogue duplo que tomei antes de entrar na Igreja, ao passar pelo botequim do pai do jogador do Mindelense Totói Munzinha. Está provado que não sou nenhum Djosa de nha Bia, um grogue bem aviado aguento, mas dois...
ResponderEliminarMas também não fui só eu a desatinar com o grogue. Não se esqueçam de que o senhor vice-cônsul de Tours confundiu "cachinha" com "cachupinha". De certeza que ele hoje não bebeu nenhum champagne, mas um bom grogue de Ribeira da Torre, S. Antão.
ResponderEliminarAgora que a malta da procissão recebeu ordem de destroçar dada por nhô padre, vamos esperar que o Marcos Soares nos traga a reportagem fotográfica da procissão e outros incidentes correlacionados.
ResponderEliminarNem Zeca Soares, nem Zito, nem Val vieram aqui apresentar provas de que não estão metidos nesta geringonça, pelo que acho que estão mesmo metidos nela. Quem cala, consente!...
ResponderEliminarBem fête!
Djack
É pena não ter havido mais malta a animar isto. Da próxima tem de se pedir a nhô padre para fazer um grande alarido com os sinos da Igreja, mas a tocar mesmo valentemente, a fazê-los repicar estridentemente até se enfurecerem os cães vadios da cidade e das fraldas, até obrigar o povo a vir a terreiro e gritar em uníssono: Pronto, nhô padre, já percebemos. É preciso ir buscar os rapazes da Praia de Bote.
ResponderEliminarO que nos vale é que temos o Djosa de nha Bia no Mindelo a fazer das suas. Ele não fala mas pelo menos age, ahahahahahaha
EliminarBraça em dia são-vicentino
Djack
Que texto interessante! assim escrito, podia ser transposto para as escolas e contada, aos mais novos - de forma bem humorada e sem trair a História - a história inicial da ilha do santo padroeiro, S. Vicente. Valeu! Gostei mesmo!
ResponderEliminarAbraços
Ondina