CABO-VERDIANOS DA AMÉRICA: TRÊS EXEMPLOS
Antigas, as relações entre Cabo Verde e os Estados Unidos da América assentam para o comum público, no que toca à emigração primordial, supostamente apenas na participação de homens da ilhas na pesca da baleia, na apanha de bagas e em pouco mais. De facto, os cabo-verdianos terão chegado pela primeira vez a Nantucket no início ou meados do século XVIII, como refere Yvonne Smart, filha de cabo-verdiana e uma das responsáveis do Cape Verdean Museum Exhibit de Providence, Rhode Island. Mas não apenas da caça de cetáceos se faz a história dos naturais do arquipélago (ou seus descendentes) nos EUA. Assim, recolhemos para os nossos leitores três exemplos sobre outras actividades a que se dedicaram estes imigrantes e documentam a ligação do povo da morabeza à terra do Tio Sam, nomeadamente nos finais do século XIX.
(...) A terceira notícia, ainda do mesmo jornal mas cerca de dois anos posterior [1897], remete-nos para algo que uma vez por outra notamos nesta época (digamos, demasiadas vezes) nos jornais de língua portuguesa dos EUA, em geral propriedade ou com forte influência de açorianos: um racismo algo boçal, entre portugueses – de que esta história é resumido exemplo –, embora não tão radicalizado como o que se vivia então nos EUA, mas ainda assim…
Trata-se de um lamento sobre questões de atropelo de trabalho com botes de transporte de turistas em Providence, Rhode Island, consubstanciado na coluna "Correio do Leste" que aqui reproduzimos integralmente para que se possa perceber o que antes afirmámos, em toda a sua extensão: "Os nossos patrícios andam aí aos grupos em busca de trabalho, e a esperança, creio, os abandona. Esperavam encontrar um recurso nos botes de excursão, mas esse perderam-no pela oposição que lhe fizeram os naturais de Cabo Verde, oferecendo-se por um salário miserável. Ainda há pouco todos se queixavam dos italianos neste sentido, mas agora, não sei o que direi daqueles. Daqui a pouco isto fica reduzido a mais que nada."
Não parecia saber (ou fingia desconhecê-lo) o articulista anónimo que "os naturais de Cabo Verde" eram tão patrícios portugueses como os patrícios açorianos, madeirenses ou continentais que por ali havia. A verdade é que esta divisão em "patrícios" e "naturais de Cabo Verde" nos diz muito sobre uma maneira de olhar as gentes do Império português que era comum na época e se arrastou, mais ou menos disfarçada, mais ou menos atenuada, até à época das independências. Ressalve-se no entanto que não se chega ao ponto de falar em cor de pele, pondo os cabo-verdianos de baratos preços ao nível dos italianos, uns como outros tentando sobreviver na selva americana do trabalho portuário, dominada por sindicatos de orientação obscura e outros constrangimentos de que meio século depois "On the Waterfront " de Elia Kazan será significativo sinal.
A informação aqui trazida, da antiguidade da emigração cabo-verdiana para os EUA, acrescida de como era a percepção e o desconhecimento afinal, na época, entre portugueses oriundos de ilhas bem diferenciadas e longínquas umas das outras (Açores e Cabo Verde) todos na busca de trabalho e de meios para viver.torna este texto de real importância histórica. Obrigada Joaquim Djack
ResponderEliminarPara quem se considera caboverdiano e emigrante, testemunha passiva ou activa em factos similares, o que expõe o menino de Praia de Bote tem um gostinho "màs mdjor", indescritivel.
ResponderEliminarObrigado "irmão"
Braça
Joaquim, isto dá bem a ideia das antigas andanças das gentes cabo-verdianas pelas terras do tio Sam. Interessantíssimo! As tuas pesquisas contribuem grandemente para que se conheça a dimensão diaspórica da nossa gente. Não conheço nenhum cabo-verdiano animado do interesse que demonstras em que se conheça este lado oculto que a História não descortina.
ResponderEliminarHá tempos, publiquei uma crónica (não sei se aqui ou no ARROZCATUM) sobre açorianos e cabo-verdianos no Faroeste Americano. A origem da emigração de ambos os ilhéus era a mesma: a pesca da baleia; e uma vez em terra escapuliam-se e até andaram pelo Faroeste. Num livro que li sobre o assunto, a presença de cabo-verdianos é referenciada pela expressão: portugueses de cor.
Grande abraço de felicitações
Sai um braça tripartido para... os três comentadores. De facto, interessa pegar nestes materiais e dar-lhes nova vida, com relacionamento e interpretação. De resto, isto dá-me imenso prazer e a coisa vai continuar. Depois destes 50, espero que venham outros 50. E já lá estão mais uns 70 do "Liberal", antigo e moderno. Cabo Verde tem um história que dá pano para muitíssimas mangas. É preciso é cosê-las...
ResponderEliminarBraça geral,
Djack
E, já agora, não há fato que não fique excelente com tão distintas mangas...Bravo!
ResponderEliminarA verdade é que se o fato é bom é porque a fazenda ainda é melhor, tweed de superior qualidade.
EliminarBraça com arroz e com atum,
Djack
Muita história ainda por desvendara partir daquilo que pode ser um manancial de informação oriunda dos EUA. Para os sociólogos hsitoriadores e investigadores como o Djack não faltará matéria para trabalhar!!!
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