sábado, 5 de março de 2022

[6114] Carlota de Barros, filial...


PAI


O adeus

melancólico

ao cimo das escadas


sorriso bondoso

eco interminável

de uma vida

tranquila

vivida sempre

para nós

dedicada sempre

aos teus doentes


vejo-te pai

sentado

a escrever

tuas memórias


sereno

concentrado 

silencioso


sinto uma dor

triste

como o voo

suave

de uma andorinha

que parte

para longe


como o teu

adeus de saudade

perdido

ao cimo da escada

no dia que te

pela última vez


vejo-te 

ao longe

entre nuvens

nostálgicas

a galope

no teu cavalo

azul e doirado


oiço

tuas gargalhadas

sonoras

a trepar

viçosas

como a hera

nos nossos 

corações

sempre tão perto

de ti


escuto 

tua voz cheia

que ocupa tudo

e todos


e

as lembranças

caem silenciosas

como folhas

de outono


esvoaçam

no tempo

vestidas

de ternura

e jasmins


porque

enquanto

te afastas

no teu cavalo veloz


deixas-nos o rasto

como estrelas cadentes

do teu amor infinito

que fez girar

nossas

vidas felizes


e como num sonho

o teu sorriso

bondoso

desenha-se

no ar

luminoso


e volto

a ouvir ao longe

tuas gargalhadas

sonoras e sãs

tua voz

cheia e viva


ecos

de tua vida

serena

vivida sempre

para nós

dedicada sempre

aos teus doentes


                      

Carlota de Barros

Lisboa, 14 de Abril de 1998

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