terça-feira, 16 de agosto de 2011

[0082] O NRP "Lima", contratorpedeiro D333... ou o desvendar do mistério do post anterior

O "Lima" a entrar em Leixões (Portugal), em 1959. Foto do blogue "O Piloto prático do Douro e Leixões" (clique na imagem)
O contratorpedeiro "Lima" (D333) esteve em Cabo Verde, mais propriamente no Porto Grande de São Vicente, entre 6.Julho.1964 e 9.Agosto.1965, em "missão de soberania" - expressão comum  na época, por motivos  políticos óbvios. Diga-se, em abono da verdade, que a sua tripulação era estimada pelas gentes locais, apesar de excepção famosa devida a  jogo de futebol que deu pancadaria, correria pelas ruas da cidade e ronda naval armada de metralhadora, na noite desse dia aziago... Mas também quem mandou o pessoal do contratorpedeiro apoiar com tanta veemência a equipa da Praia e não a do Mindelo? Quem semeia ventos, colhe sempre tempestades, ali ou em qualquer outra parte... A história está na memória dos mindelenses e num romance escrito pelo administrador do PRAIA DE BOTE... Deixemo-la, portanto.

O "Lima", da classe "Vouga", fora construído em Glasgow, nos estaleiros da empresa Yarrow & Co. e esteve ao serviço da Armada entre 1933 e 1965 (teve seis irmãos gémeos, dois dos quais foram vendidos por Portugal à armada da Colômbia), tendo sido abatido aos efectivos da Marinha de Guerra Portuguesa pouco após o seu regresso de Cabo Verde. Tinha grande capacidade anti-submarina e anti-aérea. Pequenas diferenças que podem ser notadas nas duas fotos, derivam de obras de upgrade no final da 2.ª Guerra Mundial (por exemplo, os dois mastros observáveis na foto de 1933, na de cima passaram a um).

O "Lima", ainda sem número de matrícula, em experiência ao largo de Glasgow, c. 1933. Foto do blogue "Ships & The Sea" (clique na imagem)
Ora, como era habitual (e ainda é) nos portos de quase todo o mundo, um navio que por ele passe  longamente gosta de deixar marca, no pavimento ou nas paredes do cais onde esteve atracado. Sobretudo este que se quedara no Porto Grande por quase todo um ano, fora uma ou outra ida à Praia mais algum serviço de patrulhamento. E assim, um "artista" voluntário (geralmente membro da guarnição com mais jeito para o desenho e a pintura) deixou pouco depois da entrada do cais acostável a memória que em 1999 ainda perdurava, altura em que foi feita a enigmática foto. Claro que a coisa estava algo escondida mas aqui o Djack que tem olho de águia lá a descobriu debaixo de tubos de óleo, nafta e talvez água que em tempos recentes alguém colocara por ali fora (o inevitável progresso), não sem antes terem sido despejadas em cima da pintura umas latas de tinta para fazerem apagar a lembrança do garboso navio. Não o conseguiram, totalmente porém, os vândalos, e lá ficou parte do brasão do contratorpedeiro (encimado pela caravela), a matrícula D333 e a flâmula com as datas de chegada e partida ao e do porto da morabeza.

Talvez, por um rasgo de sorte, ainda hoje subsista esta imagem no local. Se ela tiver desaparecido de todo, aqui fica a recordação e o agradecimento aos que tentaram adivinhar o que a fotografia ilustra.

12 comentários:

  1. Publicado por PRAIA DE BOTE, por conta do nosso amigo Valdemar Pereira:

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    Não posso falar do "Lima" no Porto Grande, pois já tinha saído à busca da vida como uma boa parte dos ilhéus mas a evocação dos barcos de guerra no Mindelo traz-me à memória uma estória sucedida em 1975, logo após a minha tomada de funções nesta cidade de Tours.

    Mas antes quero lamentar o sacrilégio de dar o apoio ao adversário de S.Vicente em tal jogo. Ainda se fosse uma equipa estrangeira vá lá, porque os meus conterrâneos são geralmente de fair play. Bem deixemos isso porque não vale a pena inflamar os ânimos neste momento. Prefiro dar mais uma prova de que o Mundo além de pequeno é uma caixinha de surpresas.

    Recebi nessa altura, a seu pedido, um senhor que avisou logo que não vinha solicitar qualquer protecção consular ou coisa parecida; que a sua visita era simplesmente de cortesia e para apresentação como funcionário do banco português. De seguida perguntou se já tinha bebido um ponche no botequim de Nha Luisa Manobra. Adivinhem a reacção...

    O famoso néctar preparado por Nha Luísa não podia ser vendido sem ser macerado (secretamente) durante 16 dias. Nem mais nem menos. Nha Luísa recusava vender o ponche que tinha 15 dias. Autêntico! Isto foi-me contada por várias pessoas e, entre elas, o meu progenitor pois fôramos amigos, e quase vizinhos durante um curto espaço de tempo.

    E o nosso homem? Tinha estado em S.Vicente como sargento por essa altura (se bem me lembro, no "Lima") e, ao chegar ao Portugal, desertou por o seu barco ter de ir a Angola. Ao chegar a França foi contratado para angariar fundos junto dos emigrantes na área de jurisdição. Mas posso acrescentar que os marinheiros eram todos queridos na ilha do Porto Grande. É evidente que metendo-se declaradamente pró-Praia contra Soncente, o ponche tinha de ficar azedo.

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    PRAIA DE BOTE, informa que os marinheiros do "Lima" gostavam muito de São Vicente (tal como todos os marinheiros portugueses) e que a estranha e rara história do apoio ao pessoal da Praia tem antecedentes que na altura os mindelenses não sabiam ou não quiseram saber. Salvo erro, tem a ver com o apoio que os praienses deram aos homens do "Lima" num jogo que estes travaram contra a guarnição de um barco britânico ou coisa parecida. Atenção que posso estar um pouco em erro mas a história não anda longe disto. Aliás, sem um motivo lógico (e momentâneo) quem podia não gostar de São Vicente ou das suas gentes? Só se fosse louco e os rapazes do "Lima" não o eram...

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  2. não havia a mínima hipótese de eu descobrir de onde era tirada a foto do post anterior

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  3. E, já agora, a explicação da frase de apoio, também ela enigmática: "Atrás desta fortíssima parede está o caos, o enjoo, a desgraça total, o fim do mundo."

    A "fortíssima parede" é a do cais acostável que este ano celebra o seu quinquagésimo aniversário; o "caos, o enjoo, a desgraça total, o fim do mundo" têm a ver com o dificílimo "Mar de Canal", celebrizado não só pelas viagens do "Carvalho" e de outros palhabotes como pela morna de Bana, precisamente com esse nome.

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  4. Isto é o exemplo de como se consegue, sem necessitar de grande bosquejo temático, contar estórias interessantes, umas, e pirracentas, outras, e mais proveitosamente ainda quando as duas se misturam. E tudo fica ainda mais completo quando comentadores profícuos e sempre de atalaia, como o Valdemar, lhes acrescentam o contributo das suas memórias pessoais, que são ricas.
    Já em tempos o disse, mas reafirmo ser um feito de se lhe tirar o chapéu a extraordinária memória pessoal que o Joaquim construiu em apenas 2 anos de permanência em S. Vicente, naquela tenra idade em que as preocupações estão mais viradas para as brincadeiras e os folguedos. Mas o que é notável é que ele não se limitou a deixar cristalizar a sua memória daquele tempo. Analisou-a na perspectiva dos anos mais maduros que se seguiram e fez as mais variadas extrapolações, literárias, históricas, sociológicas, humanísticas, etc, como ao longo dos tempos temos visto nas mais diferentes manifestações, das quais este blogue é um exemplo bem eloquente.
    É assim que se compreende não tenha escapado ao Joaquim, na sua visita em 1999, a memória pictórica que o NRP Lima deixou impressa no paredão do cais acostável do Porto Grande. De facto, estava mesmo difícil adivinhar. Eu nunca chegaria lá. O que mais confusão me metia eram aqueles tubos, cujo significado parecia nenhum, de todo desenquadrados daquela pintura. O facto de alguém, por ignorância e outras motivações espúrias, ter tentado eliminar a memória da presença do navio, merece apenas que o coloquemos no arquivo das coisas tristes.
    Eu professo um culto quase religioso por tudo o que é navio, e nisto não ando longe do Joaquim. A primeira vez que me lembro de ter visto o NRP Lima foi em 1961, no dia da inauguração do cais acostável. Como já tive oportunidade de dizer em outro espaço, nunca me esqueci do porte físico do comandante do navio quando, depois de desembarcar, se dirigia para o palanque da cerimónia. Fugindo um pouco à média normal, era um oficial alto, delgado e elegante na sua impecável farda branca de cerimónia. No tempo em que o navio esteve em serviço em Cabo Verde, eu já lá não estava, pelo que não tive oportunidade de presenciar a desavença que parece ter ficado nos anais do Porto. E tudo por causa do futebol, se bem que eu desconfie que haveria por trás disso tudo outros motivos, como histórias de “pequenas” e os ciúmes que naturalmente tudo isso provocava na rapaziada local.

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  5. Sim, houve uma "história de pequenas", mas não com o "Lima". A "história de pequenas" foi entre pessoal do Exército e estudantes dos anos mais avançados do Liceu e meteu pancadaria junto ao cemitério, com estudantes presos por um dia ou dois na "staçom". Mas aí o escândalo foi bem menor que este do "Lima".

    Eu estava na Praça Nova em domingo e vi mais de 100 marinheiros a correr pela Rua do Telégrafo em direcção ao cais acostável, perseguidos por uma multidão em fúria. Se bem me lembro, na altura estava no Porto Grande outro navio de guerra português, o pequeno navio balizador "Almirante Schultz". Não quero estar a mentir, mas um dos marinheiros do Schultz é que levou uma pedrada na tola, pelo que teve de ser internado no hospital de São Vicente. Comeu um justo pelos pecadores.

    Para rematar: a coisa não teve nada de político nem de amores traídos. Foi puro ódio momentâneo, devido à imprudência apoiante-futebolística dos "limianos"...

    Braça
    Djack

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  6. Mais uma vês estou a revier, mesmo que por alguns momentos, relembrando a minha infância no Caís Acostável. Tudo isto, graças a este BLOGUE e o sue Autor, a quem aproveito para lhe desejar as minhas Cordiais Felicitações.
    Sobre os motins ocorridos entre os Mindelenses e a Tripulação escuso-me de comentar, mas sim acrescentar algo mais, sobre as escalas dos Barcos de guerra da altura no Porto Grande.
    Com a inauguração do Cais, os seus imponentes muros de Betão apresenta vão limpos e convidativos para ser gravado qualquer imagem,e neste caso concreto, tratando duma infraestrutura nova, toda navio que atracasse pela primeira vez, no Cais, Fazia questão de deixar a sua marca, que era um desenho mais ou ou menos elegante conforme habilidade do seu autor, e um texto em forma de poema, ao qual expressa vão os comprimentos da tripulação à Ilha de São Vicente e a sua População.Havia dezenas destas imagens no cais, sobretudo dos navios Portugueses que faziam escala a caminho das Colónias Portuguesas de altura.Devo acrescentar com complemento a informação, que o N.R.P. "LIMA" veio substituir o N.R.P. "VOUGA" que tinha estado antes a prestar o mesmo serviço. Ainda eu me lembro do seu desenho, um perfil, de proa feito no molhe do cais do meio como era conhecido, que foi demolido com os trabalhos de modernização do Porto Grande, assim como, atrás do muro onde esta o desenho de LIMA, hoje esta um parque de Contentores com dimensão superior a dois Campos de Futebol, e só depois o Mar de Canal.
    Foi um prazer participar;
    UM FORTE ABRAÇO DE ZECA SOARES MONTE SOSSEGO

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  7. Um abraço ao Zeca Soares de Monte Sossego, local muito do meu agrado e onde residem dois grandes amigos meus: Nha Bia de Grigório (família Alves) e Virgílio Pina, ex-marinheiro da Capitania e depois Polícia Marítimo (e grande praticante de golfe).

    Participe sempre!
    Aquel braça
    Joaquim Saial

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  8. Nha Bia de Gregório mãe de 11(onze) filhos da família Alves faleceu muito recentemente nos primeiros meses deste ano aos oitenta e tal anos."QUE DESCANSA EM PAZ A SUA ALMA".
    Quanto ao Virgílio de Pina foi também um grande jogador de futebol no Castilho, continua aquele atleta de sempre, e está mesmo aqui ao lado; se tens algum recado para ele é só dizer.
    UM ABRAÇO
    ZECASOARES

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  9. Caro Zeca Soares,

    Esta notícia é muito triste. É uma porta que se fecha para mim, em São Vicente. Conheci muito bem a senhora e nas duas vezes que regressei a São Vicente fui visitá-la ao Monte Sossego, sempre com grande alegria para ambos. Soube depois que tinha caído e partido um braço ou coisa parecida. Telefonei-lhe várias vezes, sobretudo em ocasião de final de ano. Sou amigo dos filhos Terêncio e Encarnação (ambos na Praia) e Afonso "Fony" (em Porto Novo). Conheço pelo menos mais duas filhas, de cujos nomes não me recordo. E ainda conheci o senhor Gregório, trabalhador da Shell.

    Ao Virgílio, dá-lhe o meu grande abraço e diz-lhe que talvez em Janeiro de 2013 nos vejamos de novo, como espero. Ele era um dos melhores marinheiros da Capitania dos Portos e seguiu sempre essa vida, na qual foi subindo devido à sua competência. O meu pai tinha uma grande estima por ele e eu também.

    Obrigado pela tua informação, apesar de muito triste. Vou dedicar o próximo post à Nha Bia. Fica atento.

    Um grande abraço
    Djack

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  10. SENHOR Djack,a vida é mesmo assim; de Alegrias, e Tristezas.
    Todos nós temos o nosso dia. O Dela chegou, vai chegar o meu, o teu, e assim por diante.
    O mais importante é o cumprimento do dever de cada um.A FAMÍLIA ALVES é, como varias outras famílias tradicionais, ser seguido como exemplo, talvez não tanto pela quantidade, mas pela qualidade.
    Hoje, por exemplo fala-se muito de que é preciso ensinar os pais a educar sues filhos.SINAIS DESTES TEMPOS!!!

    MANTENHA PATUDGENTE

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  11. Fiz parte da tripulação do contratropedeiro Lima de 31-02-60 a 26-07-63, não me recordo do jogo de futebol ou ouvir comentários sobre o assunto, mas recordo bem o dia de inauguração, quando da atracagem inaugural, a proa do navio bateu fortemente no molhe, sem grande avarias, também sofremos graves avaria nas turbinas, quando estávamos presando a lagosteira francesa Maria Antonieta, das lagostas confiscadas enormes foram distribuídas para várias identidades na cidade de Mindelo, abraço. Frederico barrigana

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    1. Obrigado pela participação, caro Frederico, mas se não se lembra é porque não fazia parte da guarnição nessa altura. A coisa foi forte e feia, mas depois tudo acalmou. Talvez tenha conhecido o meu pai que era o patrão-mor da altura, sargento de manobra Narciso Silva. Depois ainda foi mestre da Diogo Cão e da Magalhães Correia. Belo navio o Lima e muito elegante, não me esqueço da silhueta dele a navegar na baía.

      Grande abraço e volte sempre.

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