sábado, 23 de novembro de 2013

[0636] Desinçar da economia a mafia especulativa

Arsénio de Pina
Prometi falar, num artigo anterior, por golfadas para não cansar os leitores modernos que preferem a TV. Como, no meu último livro - Adeche! Vendilhões em Vários Templos - ainda falo, entre variados assuntos, na globalização, acrescento, nestas linhas, um ou outro ponto que nos ajudará a ver mais claro.

A economia de mercado, que tem virtudes inegáveis, por saber criar riqueza, embora não saiba nem lhe interesse distribuí-la com equidade, quando devidamente controlada pelo Estado e não deixada, como vem acontecendo, à rédea solta, por conta da camarilha do ultraliberalismo. Ela procura convencer-nos de que a saída para uma vida melhor é uma questão individual; que Deus e o Estado se preocupem com os pobres e miseráveis. Outrossim, entidades teoricamente vocacionadas para ajudar os povos a sair  do subdesenvolvimento e da miséria, como o FMI e o BM, argumentam que a angústia humana, não sendo quantificável nem um elemento de análise macro-económica mensurável em termos económicos, não existe, não conta. Sabido é que organizações deste tipo e credores internacionais jamais auxiliam um escravo a levantar-se da lama, tão simplesmente porque, para eles, um escravo de pé já é um risco.

Paul Colleer, professor de economia na Universidade de Oxford, definiu a minoria de milionários e banqueiros que vive à custa dos lucros da exploração dos que trabalham e de depósitos de dinheiro sujo – pessoas que vivem de ganhos imorais de outros – como proxenetas. Não digo que esse tipo de regime, que permite tamanha injustiça e exploração, seja de tirania, mas antes de oligarquia, isto é, um regime cujo poder é movido pelas piores paixões: a concupiscência, a desumanidade e a corrupção.

Sendo essa a realidade que temos tido desde a implosão do comunismo na URSS, porque o capitalismo e os ricos deixaram de ter medo desse gongon que lhes frenava o apetite, a actualidade é a que vivemos, acrescida de crise larada. Há gente a contar com milagre para a solução da situação, o que não é de acreditar, por o milagre ser como um golpe de Estado dado por Deus contra as suas próprias leis – o que é inconcebível em Deus; há que procurar outra saída, antes que haja uma revolta violenta, como aconteceu em França, em 1789, em que os camponeses famintos e desesperados invadiram as cidades e deram mais força à acção dos revolucionários juntando-se a eles.

Facto raramente citado é a Revolução Francesa ter sido consequência do Pequeno Período Glacial, ocorrido entre os séculos XIV e XIX, que atingiu duramente a agricultura, levou à estagnação da população francesa e provocou grande mortandade por frio e fome na Europa. Foi também uma das causas da derrota de Napoleão ao invadir a Rússia devido ao rigoroso Inverno com que não contavam, derrota na qual, dos 600.0000 soldados da invasão, só regressaram 40.000 homens.

Actualmente, o risco de revolta reside na grande crise global económica, social e financeira e na incapacidade de os governantes do tipo light tomarem as decisões que a situação impõe de justiça e solidariedade e não de promoção do individualismo, de austeridade e de tolerância da economia especulativa que só servem os interesses egoísticos de classes privilegiadas.

Parede, Outubro de 2013
Arsénio Fermino de Pina


2 comentários:

  1. É preciso uma reforma deste capitalismo 'débridé' que tornou-se numa autêntica barata tonta, para refreá-lo no seu apetite insaciável pelo dinheiro. Um sistema imoral onde o dinheiro e a sua acumulação são os únicos valores, e que já está a fazer cada vez mais vítimas e infelizes por todo o mundo. não funciona mais. Mas como reformar um sistema baseado na globalização, que já é totalmente globalizado e descontrolado. Não se esqueçam que muitas das decisões encomendadas pela especulação financeira pura e dura são assistidas por computadores e programas económicos sem cara nem sentimento, como foi o caso dos subprimes. Thats the question. O século XXI se não se tomar cuidado será o da ditadura do virtual e do global, onde o trabalho ou seja o ganha pão será um bem muito precário. Os portugueses já sentiram isto na pele, Estamos todos feitos ao bife neste planeta enlouquecido pelas finanças.

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  2. Tanto o magnífico texto do Arsénio como o notável comentário do José me encheram as medidas. O mundo e os sistemas que o fazem mover precisam sempre de mecanismos reguladores. É a história da humanidade que no-lo ensina. Os dois anteriores blocos antagonistas marcaram um certo equilíbrio entre os seus sistemas económicos desde a II GM ao colapso de um dos contendores. Agora parece que estamos num beco sem saída, ante a aparente impossibilidade de o sistema globalizado regular-se por si próprio. Mas isso terá de acontecer de uma forma ou de outra, sob risco de um aumento incontido da sua própria tensão interna, que causará uma implosão. Ou então será uma revolta dos pobres à escala mundial que o irá provocar, situação que naturalmente ninguém deseja, dadas as suas catastróficas consequências. Não sentem que a civilização dá sinais de estar em fim de ciclo? Pois, não será que o suporte desta globalização é já o triunfo da máquina sobre o homem, inaugurando-se mais depressa do que se pensava? É o pensamento que por vezes me perpassa.

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