sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

[0694] Irmandade dos Homens Pretos de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos de Ribeira Grande de Santiago

Nuno Rebocho
PRAIA DE BOTE tem a honra de oferecer aos seus leitores habituais e a todos os interessados no tema este magnífico texto de Nuno Rebocho que versa assunto de notório interesse para a compreensão das antigas dinâmicas religiosas e sociais da primeira capital de Cabo Verde. O artigo está também publicado no blogue CIDADE VELHA 1462.

Em contrário do mencionado em livros e documentos diversos (vg. “A importância histórica de Cidade Velha”, Daniel A. Pereira, Instituto da Biblioteca Nacional e do Livro, 2004 e “Cidade Velha – Sítio Histórico, Séc. XV”, PROIMTUR), a Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos não pode ter sido mandada construir pela Irmandade dos Homens Pretos de Ribeira Grande, a ter-se em conta a vetustez do monumento (1).

Igreja de Nossa Senhora do Rosário
O templo foi erguido em 1493, segundo alguns autores - ou em 1495, segundo outros -, sendo a igreja mais antiga hoje existente em Cabo Verde e a sul do trópico de Câncer, feita em pedra especialmente vinda de Portugal, ostentando uma capela com teto manuelino, ogival (o único no continente africano) e possuindo restos da original azulejaria de fabrico português. Não se trata da igreja mais antiga construída em África: a mais antiga foi a Igreja de Nossa Senhora da Conceição, que inicialmente se chamou do Espírito Santo, que terá sido erguida em 1466 ou 1470, mas dela não existem hoje quaisquer vestígios – foi construída em pedra solta e barro, portanto menos rica e sólida, com baixela e alfaias de ouro e outras riquezas paramentais e religiosas (que foram pilhadas e algumas transferidas para a cidade da Praia), recebendo inicialmente algumas das pedras tumulares de famílias nobres e possidentes de Ribeira Grande de Santiago (portanto de origem reinol) observáveis na Igreja de Nossa Senhora do Rosário. Ao que se sabe, a nobreza reinol e algumas famílias “pardas” (crioulas) disputavam nestas igrejas, e mais tarde na Sé, o lugar de sepultamento.

Ora, a Irmandade dos Homens Pretos é decididamente posterior à fundação destas igrejas: inicialmente associação (instrumento) de defesa e solidariedade dos escravos africanos que começaram a chegar à ilha de Santiago depois de 1462 (data do início do seu povoamento), a Irmandade reflete a ação da Igreja Católica sobre eles, embora sirva também e muito para preservar tradições religiosas camufladas dos escravizados vindos de diferentes partes de África, sobretudo dos “rios da Guiné”. Nestas condições, a Irmandade dos Homens Pretos seria originariamente demasiado pobre para poder mandar alçar este templo em pedra, por conseguinte muito oneroso.

Demais, o facto da Igreja de Nossa Senhora do Rosário ser lugar de sepultamento disputado pelas famílias nobres, pelo menos até ao séc. XVII (data das pedras tumulares mais recentes na cidade encontradas), desde logo afasta a possibilidade de ser simultaneamente um lugar pertencente a uma Irmandade de Homens Pretos, escravos na grande maioria – os reinóis não eram obviamente dados a tamanhos “democratismos”. 

Por outro lado, a primeira carga de escravos, cuja referência é feita por Gomes Eannes de Azurara, in “Chrónica dos Feitos da Guiné” (capítulo VII), foi em 1442, sendo embarcados para Lagos - data que medeia apenas 50 anos antes da construção da Igreja, tempo então demasiado curto para conceber que já houvesse este tipo de Irmandade. E desde cedo apareceram os “fujões” (escravos escapulidos do cativeiro e internados na ilha que, apesar de ser geograficamente uma “prisão”, dispunha de bons lugares de refúgio). Mas esta é também uma forma de povoamento objetivo, o dos “badios” (palavra crioula que designa “evadidos” e designa os naturais da ilha de Santiago). A “fuga” é a primeira manifestação de resistência (negação) à escravatura, na busca de uma liberdade ansiada.

Cidade Velha - Vista da "baixa"
Para a neutralizar, formaram-se grupos de “caça aos fujões” (de que há memórias documentais), alguns deles integrando escravos que também participavam nesta atividade extremamente lucrativa a qual terá dado origem a uma camada de “aristocracia escrava” (chamemos-lhe assim) de onde emergiu mais tarde a Irmandade dos Homens Pretos (já da confiança dos reinóis possidentes e por estes beneficiados). Há notícia de que os “fujões” se agruparam em alguns quilombos (lugares fortificados) onde resistiram de armas na mão aos seus perseguidores. Tal processo curiosamente também se afirmou, em anos posteriores, no Brasil, onde se formaram muitos e tendo duração variável.

Mais operacional terá sido outro processo de neutralizar as fugas – a construção de muralhas rodeando a cidade e que ainda são hoje visíveis em cutelos de Cidade Velha.

O aparecimento da Irmandade

Terá sido desta massa de caçadores de “fujões” que saiu parte substancial da Irmandade, que – por via dela – obteve uma capacidade associativa alentadora, quer em forma de defesa, de solidariedade e de apoio. Juntaram-se-lhe forros que foram aparecendo, a par de escravos senhores de escravos que se internavam, como “lançados”, na região dos Rios da Guiné e que, ocupados no tráfico de escravos, resistiram melhor às condições do meio. Estes escravos foram granjeando algum capital próprio e para as suas iniciativas – há deles copiosas notícias. E juntou-se uma massa de descendentes de escravos, semilivres, que mesmo sendo a “camada superior da plebe”, se situavam numa área inferior da sociedade. 

Em fins do séc. XVII, inícios do séc. XVIII e até à extinção da Irmandade com o episódico desaparecimento da Ribeira Grande (o que acontece pouco depois da ascensão da Praia a capital do País – em 1770), a Irmandade é já constituída tão só por homens livres (“pardos”) e assume plenamente a dignidade de ter igreja sua. De resto, a existência de clero negro era um facto visível em Ribeira Grande, fruto da crioulização começada a tecer pelo terceiro bispo da diocese criada em 1533 (31 de janeiro), D. Francisco da Cruz, e que merece especial referência do Padre António Vieira, em 1652, aquando da sua passagem por Ribeira Grande, a caminho do Brasil: “Há aqui padres tão negros como azeviche. Mas só neste particular são diferentes dos de Portugal, porque tão doutos, tão morigerados, tão bons músicos que fazem inveja aos melhores das melhores Catedrais de Portugal"

Pe. António Vieira - Retrato de autoria desconhecida
Em 1612 há notícia de que havia em Ribeira Grande sete confrarias/irmandades (2): a do Santíssimo Jácome, a do Bem-Aventurado S. Jacinto, a da Cruz, a das Almas do Purgatório, a da Santíssima Trindade, a do Nome de Jesus e a de Nossa Senhora do Rosário (que depois ganhou o nome de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos), de que era mordomo Diogo Sousa, e a que se veio a juntar a do Santo Sacramento e outras. Deve portanto concluir-se que a Irmandade, nascida na igreja de Nossa Senhora do Rosário e a partir de escravos e seus descendentes, só depois teve o nome de “Homens Pretos”. E que, apenas depois dessa data, é que ela se apossou da Igreja de Nossa Senhora do Rosário.

Assim, terá sido progressivamente que esta Irmandade se afirmou: insuflada pelos frades dominicanos, veio aos poucos ganhando espaço, começando por ser uma congregação menor e desqualificada. À medida que os “pardos” e os “homens da terra” foram ganhando posição, até por força da progressiva desintegração da sociedade reinol, a Irmandade reforçou-se até que, com o apoio de um bispo de extração dominicana, fez-se a principal confraria de Ribeira Grande, sediada na Igreja de Nossa Senhora do Rosário, que aliás os Homens Pretos terão ajudado a construir (resta saber em que moldes o fizeram – que se saiba, não existe documentação).

Quando o esclavagismo é abolido – em Inglaterra tal foi imposto por lei em 1807 e em todo o império português por lei de 1836, embora no continente português o tenha sido por lei do Marquês de Pombal em fevereiro de 1761 – já a Irmandade tinha enorme importância em Ribeira Grande, burgo já reduzido a muito pouco e pobre devido à perda do domínio das rotas comerciais e marítimas, dando-se o seu afundamento na memória dos tempos - outrora imponente, concentrava num reduzido espaço um total de 24 igrejas (entre elas a igreja de S. Roque, a da Conceição, a de S. Pedro, a da Misericórdia, a Sé, a de Nossa Senhora do Rosário, a capela de Monte Alverne, a capela de Santa Luzia) e capelas, muito clero, enfim quase uma “Braga de Cabo Verde”. Na sede do bispado havia o cabido com o bispo, um deão, um pregador, um tesoureiro, um arcediago, um chantre, um mestre-escola, um provedor, um vigário-geral e 12 cónegos. A esta estrutura eclesiástica havia que somar as Ordens, a Mesa da Consciência, os párocos das diferentes paróquias, o convento, o hospital, as Irmandades, os funcionários administrativos ao serviço da igreja; percebe-se a enorme dimensão da estrutura clerical e a importância que ela assumiu na sociedade de Ribeira Grande de Santiago.

Uma emanação dominicana

Imagem da Sé
A Irmandade dos Homens Pretos, heterogénea na sua composição, terá assim aparecido talvez em fins do séc. XVI, animada por padres dominicanos radicados em Ribeira Grande de Santiago, que tiveram um papel importante na capitania e no povoamento. Digamos que a Irmandade surge com complemento da ladinização dos escravos – é uma etapa superior da escravatura, mas integra apenas os escravos que mereceram a confiança dos proprietários. Não existem documentos que permitam balizar o seu surgimento. E quando a Ribeira Grande recebe – em 1610 - o seu sétimo bispo, Frei Sebastião de Ascenção, ordenado dominicano, a Irmandade teve enorme impulso, aproveitando-se da particular estima que o prelado tinha pela igreja de Nossa Senhora do Rosário – onde este bispo foi sepultado – como tinha pela Confraria dos Homens Pretos, nascida sob influência dominicana, enorme apoio. Deste modo, a Irmandade tornou-se então a principal congregação de “irmãos”, correspondendo à circunstância de Nossa Senhora do Rosário se ter então tornado na principal igreja de Ribeira Grande. 

A Ordem mendicante dominicana, essencialmente urbana, foi fundada por Domingos de Gusmão (um cónego castelhano nascido em 1170 e falecido em Bolonha em 1221), depois da experiência obtida no combate aos cátaros e a sua falhada conversão: referida como Ordem dos Pregadores, surgiu no sul de França, apresentando-se de início como um ramo da Regra de Santo Agostinho (devido às limitações impostas pelo Concílio de Latrão, que proibia a criação de novas Ordens) e adotando então o voto de pobreza. Em 1221, com a aprovação das suas regras de funcionamento no primeiro Capítulo Geral da Ordem, ganhou um certo cariz democratizante no qual todos os cargos, do mais alto (mestre geral) ao mais pequeno, sempre exigia a respetiva eleição, dando-lhe um caráter não elitista, muito voltada para a burguesia emergente, os pequenos artífices e operários. No anto, por bula do Papa Gregório IX (1233), a Regra Dominicana identificou-se com o Tribunal do Santo Ofício (Inquisição), tornando-se maligna arma de combate às correntes que eram tidas como hereges. Devota de Nossa Senhora do Rosário, foi muito influente em Cabo Verde e, de modo geral, nas colónias ultramarinas de Portugal e Espanha.

São Domingos, por Fra Angelico
Em Ribeira Grande de Santiago verifica-se a partir dos fins do séc. XII um processo de decomposição e decadência da sociedade reinol, devido a diversos fatores que a levam a perder o predomínio no tráfico negreiro. Os senhores aceitam começar a misturar-se, sob rígidas condições, com a plebe que povoava as tabernas, a doca, os bordéis – é um facto que evidencia já a queda dos senhores, acossados pelos corsários e portanto dispostos a cedências perante o “inimigo interno”. Tal facto marca a época filipina (são deste tempo as últimas pedras tumulares de que há memória). É nessa altura, socorrendo-se da crise económica avassaladora, que a Irmandade se lança à ocupação de um templo que lhe é historicamente anterior. A Igreja de Nossa Senhora do Rosário passa a ser dos Homens Pretos.

Não se sabe a data exata do nascimento da Irmandade dos Homens Pretos de Ribeira Grande de Santiago. Todavia, nunca poderá ser antes do séc. XVI – não existem documentos sobre ela - os escravos e seus descendentes eram analfabetos (3). Pode intuir-se que deve ter surgido, por influência dominicana, durante os anos quinhentos (na melhor das hipóteses), procedendo de pouco a Irmandade do mesmo nome criada em Lisboa com as mesmas razões que lhe deram origem e antecedendo iguais Irmandades criadas no Brasil, em São Paulo e Bahia, nos sécs. XVII e XVIII – é de admitir que a experiência cabo-verdiana tenha de algum modo servido, transmitida por algum escravo para lá levado, para impulsionar igual movimento brasileiro.

Artesanato da Cidade Velha
Estas Irmandades de Homens Negros foram formas de resistência negra aos terra-tenentes como o foram as revoltas e a fuga de escravos, havendo notícia da formação de (tal como no Brasil) dois ou três quilombos no interior do Município. Mas a igreja de Ribeira Grande era profundamente escravocrata: não só padres eram donos de escravos como as suas receitas provinham essencialmente (direta ou indiretamente) do tráfico particularmente dos rios da Guiné. Pelo menos, a igreja recusava-se a dar apoio às expressões anti-esclavagistas que começavam a aparecer, com algumas poucas exceções – por exemplo as do padre jesuíta Fernão Guerreiro, que se indignou e combateu alguns “excessos” transparecidos num seu significativo documento “entre os muitos abusos que havia nesta terra, um grande se tinha no batismo dos pretos que vêm da Guiné. Que como são muitos, se batizavam logo trezentos, quatrocentos e setecentos juntos; e como destes os mais são os que vão daqui para Índias, Brasil, Sevilha e outras partes, acontece que muitas vezes que pela pressa da embarcação que seus senhores lhes dão por não perderem a ocasião do tempo, o não deixam ter aos pobres para serem catequizados e instruídos na fé como convém…” (4); e o bispo D. Vitoriano Portuense que ousou intervir no tráfico negreiro com excomunhões, denunciando a superlotação de navios e as condições de embarque, como ausência de batismo e de catequização dos escravos. São vozes isoladas que, mesmo assim, desencadearam protestos dos possidentes, do Reino e da própria igreja – foi acusado de provocar graves prejuízos e de “excessos”. Estas vozes timidamente progressistas surgiam a destempo para ter algum efeito.

Imagem da Sé, mandada construir no séc. XVII pelo terceiro bispo de Santiago, D. Francisco da Cruz


Os “irmãos” da Irmandade eram, como o nome indica, pretos libertos que, tornados cidadãos, encontravam na associação modo de ganhar algum relevo na sociedade. Tinham uma mesa da Irmandade, com os seus secretários, liderado por um mordomo que era eleito entre os mesários. No Brasil estes “irmãos” recebiam o nome de “malungos” 5.

Século e meio de Bispado de Santiago (Ribeira Grande)

Diocese desde 1533 (31 de Janeiro), por ela passaram os mais diversos bispos, estando nos intervalos o bispado estado em regime de vacatura gerido correntemente pelo cabido – devido a falecimento do bispo, demoras em Lisboa e outras razões. Todo bispado era por isso afetado, dado que cabia ao pontífice, e só a ele, nomear prelados. Enquanto o bispado esteve sediado em Ribeira Grande houve os seguintes bispos:

- Dr. Brás Neto – tomou posse em 1533
- D. João Parvi – de 1533 a 1596
- D. Francisco da Cruz – até 19 de Março de 1574 (falecimento)
- D. Bartolomeu Leitão – de 1576 a 1580
- Frei Pedro Brandão – de 1588 a 1606 – longo litígio com a coroa e os nobres de Ribeira Grande; comandou a resistência aos corsários
- D. Luís Pereira de Miranda – tomou posse em Lisboa em 1607, mas só chegou à diocese em 1608, tendo falecido um mês depois.
- Frei Manuel Afonso da Guerra
- Frei Sebastião de Ascensão – faleceu a 16 de Março de 1614
- D. Lourenço Garra – 1646, faleceu a 1 de Novembro desse ano. 
- D. Francisco de Santo Agostinho – fugiu para o interior da ilha aquando do ataque de Jacques Cassard a Ribeira Grande de Santiago e de lá conduziu o contra-ataque contra os franceses.
- D. Frei Vitorino Portuense

Síntese
A Irmandade dos Homens Pretos, associação religiosa de solidariedade, terá aparecido por influência dominicana no séc. XVI (está por saber como se verificou tal influência). Com a decadência da sociedade reinol, ganhou progressiva importância até à sua sediação na Igreja de Nossa Senhora do Rosário, tornando-se no séc. XVII, por força do bispado de D. Frei Sebastião da Ascensão (também ele dominicano) na mais influente Irmandade existente em Ribeira Grande.

Notas

1. Sabe-se que alguns “Homens Pretos” (provavelmente escravos ou “pardos”, crioulos) ajudaram na sua construção, mas desconhece-se em que moldes. Mas daí a concluir-se que a Irmandade a tenha mandado erguer vai um passo demasiado largo e impossível de ser dado sem a mínima prova não contestável.

2. Vinte e quatro igrejas, sete irmandades, grande peso do clero na população, uma sé, uma escola jesuíta (que ambicionava ser seminário – foi ponderado em tempo de D. Sebastião, mas nunca passou do papel): Ribeira Grande teve tudo para ser a “Braga de Cabo Verde”. No entanto, tal como a cidade sofreu enorme decadência que levou ao seu desaparecimento em consequência da crise económica e social que sobre ela se abateu, os seus templos foram caindo em ruínas: no séc. XVIII não havia mais que memória da antiga grandeza da “cidade do mais antigo nome”.

3. A existir qualquer documento referente à Irmandade e à Igreja de Nossa Senhora do Rosário só, em princípio, se achará no acervo dominicano ou excecionalmente em qualquer documento avulso. Sendo certo que a Igreja Católica teve papel importantíssimo na colonização, não é conhecido que ela tenha em Cabo Verde apetências historiógrafas, se bem que só tenha que se vangloriar do seu passado.

4. In “Relação anual das coisas que fizeram os padres da Companhia de Jesus nas missões, noa anos de 1600 a 1609 e do processo de conversão e cristandade daquelas partes”.

5. Os idiomas bantu – segundo Prof. Kabengele Munanga, festejado antropólogo nascido no Congo e docente na Universidade de São Paulo - variam os seus substantivos por prefixação e seus principais plurais são ba – por exemplo – ma – de mashona, plural de shona, ou mashope, plural de mashope– e wa. Lungo, em grande parte destes idiomas, dentre os quais o quimbundo, mais ou menos predominante entre os angolanos escravizados que chegaram ao Brasil, significa amigo, mas com sentido mais amplo que o que tem em português; malungo, por esta linha, seria amigos, companheiros, aqueles que, de algum modo, partilham algum momento significante de vida: a senzala, o transporte no mesmo navio, etc., etc. Em shangana, língua de Moçambique, existe mulungo (termo que designa o homem branco, o que de certa forma reflete uma atitude de apropriação, num sentido igualitário, de qualidades invejadas no ex-dominador). Nota enviada pelo estudioso brasileiro Ademir Barros dos Santos.

7 comentários:

  1. Belo e minucioso trabalho sobre uma questão pouco clara...Cada vez aprecio mais os historiadores e a sua extraordinária capacidade de nos arrastarem nas asas das suas covicções...

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  2. Não se trata de um historiador, mas neste particular isso não faz a mínima diferença. Estamos perante um conceituado jornalista, escritor e poeta (e radialista) com grande traquejo na sua área e que sabe pesquisar e escrever bem. Isso, aliado a uma vasta cultura, dá textos como este, outros já escritos e muitos que hão-de vir.

    Braça a cheirar a arquivo,
    Djack

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    1. Então, pergunto eu, o que é que lhe falta para ser historiador? O canudo?
      Eu sei de alguns "historiadores" encartados para quem o canudo só dá para ver Braga...
      Braça
      Zito

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  3. E esqueci-me de dizer que ainda por cima gosta de Cabo Verde que se farta...

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  4. Isto é assunto para ler com um vagar que hoje não tive, pelo que volto amanhã. A coisa parece que promete.

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  5. Bom temos aqui um trabalho de grande interesse e de grande qualidade resultante de uma pesquisa séria e honesta. Concordo com o autor da inverossimilidade de uma igreja da dimensão da Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos poder ter sido mandada construir pela Irmandade dos Homens Pretos de Ribeira Grande em pleno Sec XV no auge da escravatura. Na ausência de dados concretos esta hipótese só pode provir de especulação científica e de um piscar de olhos paternalista à História de Cabo Verde. Em todos os casos não ajuda em nada o avanço do conhecimento. Para o Portugal de então em que a religião era o Braço Espiritual do Reino, em que se proclamava o grande desígnio de uma nação a Expansão do Cristianismo me parece que a construção e a administração das igrejas como as inúmeras que havia me Rª Grande de Santiago só podiam estar a cargo dos oriundos reino, isto é a elite nobre e eclesiástica

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  6. Grande trabalho de pesquisa e de valor historiográfico. Li com gosto e melhorei os meus conhecimentos sobre este aspecto da história do território. Sublinho a existência de 24 igrejas na Ribeira Grande. Foi coisa de monta para uma comunidade tão pequena! Mas dá para ver o papel que a Igreja teve na colonização, distanciando-se daquilo que foi a mensagem de Nosso Senhor Jesus Cristo, ao alinhar com a mais abjecta exploração da criatura humana. As 24 igrejas não são testemunho de progresso e civilização, mas de hipócrita tentativa de lavar consciência supondo-se absolvido debaixo do tecto do Senhor. Haja Deus!

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