Proteger o património cultural de um país é isto também!
Dois poemas de Pedro Corsino de Azevedo (1905-1942)
TERRA-LONGE
das realidades que apenas sonhei,
cansado pela febre do mais-além,
suponho
minha mãe a embalar-me,
eu, pequenino, zangado pelo sono que não vinha.
"Ai, não montes tal cavalinho,
tal cavalinho vai terra-longe,
terra-longe tem gente-gentio,
gente-gentio come gente."
A doce toada
meu sono caia de manso
da boca de minha mãe:
"Cala, cala, meu menino,
terra-longe tem gente-gentio
gente-gentio corne gente."
E envelheceu lá dentro
Não posso conceber
O que vêem as meninas
Dos meus olhos
Depois que sou livre.
Abrolhos são flores,
Amores, vida.
0 que é a magia da sombra!...
Agora já posso gritar:
Livre! Livre!
Tapei o poço da morte, a cantar.
CONQUISTA
Trás!...
Explodiu a Verdade,
Agora sou capaz
De tudo
Indiferente e quedo e mudo
Deixarei escangalhar o brinquedo
Que temi na Infância,
Rasgou-se o céu em mil fatias lindas,
Ricos
Fanicos
Que recolhi na mão.
Desilusão!
Cristal, cristal, cristal!
E eu a namorar o mal...
Esse assunto interessa-me sobremaneira, uma vez que minha familia do lado materno e toda da Praia Branca - S. Nicolau. Ja algumas vezes pensei na possibilidade de descobrir como e que esse Povoado nasceu. Talvez o Edil do Tarrafal poder algo fazer nesse sentido, uma vez que ele tambem tem la suas origens. A ver vamos no que da.
ResponderEliminarNita Ferreira
Se cada Edil dos nossos Municípios adoptar o sistema de valorizar os seus filhos municipes, contribuem para a educação dos jovens ou para lembrar aos que esqueceram os que, de uma for ou de outra, se notabilizaram e enriqueceamr a nossa Historia.
ResponderEliminarJá é mania sobressairmos os factos ou nomes de estrangeiros, alguns até que nada têm a ver connosco, e desprezar o que é nosso, algumas vezes por eles pertencerem a tal ou tal lugar. Lembrem-se que, por bem ou por mal, somos todos filhos da mesma terra: - Duarte Silva, Januàrio, Eugénio, Jorge Barbosa, Cardoso, Cesària, Ildo, Pantera, etc. foram todos caboverdianos.
Este edil do Tarrafal parece apostado em lançar uma pedra no pântano em que as coisas cabo-verdianas ficam muitas vezes atoladas e inertes, para mal da nossa gente. Ele já me tinha enchido as medidas quando se meteu pelas estradas e cutelos fora para ver com olhos de ver a realidade dos seus munícipes. Não delegou, foi ao encontro das pessoas mais desprotegidas, ouvi-las, fazer-lhes ver que o poder não é coisa abstracta, distante e estática. Na altura, questionei até onde e até quando conseguiria ele manter semelhante pedalada de vitalidade e entusiasmo, sabendo-se, como se sabe, que não faltam casos deste género em que o fôlego inicial tem apenas a duração do fogo de artifício.
ResponderEliminarMas depois disso fomos tendo sinais de iniciativas a demonstrar que o homem é assim mesmo, não brinca em serviço. Tanto precisamos de autarcas e governantes deste quilate!
Agora tem esta louvável iniciativa de reprojectar e honrar como merece a memória de Pedro Corsino de Azevedo, um poeta tarrafalense que merece ser estudado, apesar da sua pouca produção.
Este edil é daqueles que eu gostaria de conhecer e abraçar. Quem sabe, um dia...
Achei interessante relembrar um texto de José J. Cabral publicado no A Semana de 13 de Fevereiro de 2013, sobre este poeta:
ResponderEliminarSanicolaense (Patchê), como ele, poderei ser acusado de puxar a brasa para à minha cavala, ao reclamar melhor estatuto e tratamento dessa figura notória da nossa história e cultura, esquecida ou simplesmente ignorada.
Então, faço uso das palavras do saudoso Dr. Mário Fonseca, que numa eloquente intervenção, lembrou-se de Pedro Corsino d’Azevedo, descrito como “ Um poeta claridoso, que foi colocado um tanto à margem, e que, apesar de ter morrido com apenas 37 anos, e ter deixado somente oito poemas publicados, teve uma poesia não de adolescente mas lúcida e adulta. Por isso ele fez um apelo aos investigadores que o estudassem melhor e procurassem mais poemas que o poeta porventura possa ter deixado.”” …
Ou de então, de uma declaração proferida durante o simpósio realizado sobre “Cabo Verde, a Europa e o legado de Amílcar Cabral”, em que se afirmou:
No processo de construção da Cabo-verdianidade, houve vários momentos:
“ O primeiro protagonizado do lado cabo-verdiano, fundamentalmente por escritores, dentre os quais se destacam, no primeiro os “nativistas” (Eugénio Tavares, Pedro Cardoso, José Lopes), … e no segundo, pelos fundadores do “Movimento Claridoso “ - (Baltasar Lopes, Jorge Barbosa, Manuel Lopes, João Lopes, Pedro Corsino d’Azevedo) ;
O apelo de Mário Fonseca parece ter caído em orelhas moucas, porquanto se desconheça qualquer estudo aprofundado. Independentemente disso considero que os dois pressupostos referenciados justificam por si só a perpetuação da memória deste, entre outros ilustres Cabo-verdianos esquecidos.
Da linhagem dos Lopes da Silva, ostenta o apelido Azevedo, resultado de uma longa peripécia familiar, aliás contada pelo filho Osvaldo no jornal Art & Letra.
(Continua)
(Contiunação)
ResponderEliminarNasceu em Praia Branca no dia 4 de Fevereiro de 1905 (Completaria 108 anos), filho de José Maria Cabral d’Azevedo, que foi professor na Praia Branca, sob cuja responsabilidade funcionou uma escola régia, nos anos letivos de 1884/85 a 1886/1887.
Seus três anos de frequência do seminário, terão propiciado-lhe embasamento intelectual e académico para suporte de sua sensibilidade inata, de poeta mítico e perspicaz, que nos legou poemas, (infelizmente poucas conhecidas), dominadas pela tensão entre o presente e o ausente, com traços de onirismo e evasão.
Dedicou-se à atividade comercial, no exercício da qual visitou a ilha do Fogo, onde enamorou-se da jovem Ana Zazá, com quem esposou e teve cinco filhos, entre os quais o major, escritor, poeta Osvaldo Aranta Azevedo (Também ele ignorado), não obstante tratar-se de figura notória que, ao lado de Amílcar Cabral, combateu nas matas da Guiné, pela independência de Cabo Verde.
Quis a sorte que seus últimos anos da atribulada vida fossem vividos em seu torrão, onde entre outras tarefas, dedicou-se ao ensino. Em Tarrafal, lecionou no ano letivo 1938/39, uma turma de 15 alunos, dos quais, Djódja Fina, que aos 86 anos, viva e lúcida recorda o “professor - Nhô Pedrinho”, hóspede de Nhô Djilipse, e ensinava-lhes numa casa que se situava onde é hoje a alfândega, junto ao porto de Tarrafal.
Em estudo publicado, Manuel Ferreira afirma que foi ele, quem modificou a poesia Cabo-verdiana, no conteúdo e na forma. Por isso, atribuiu-lhe o estatuto de pai da moderna poesia Cabo-verdiana. Porém, não sendo minha seara, não me atrevo a escrever. António (Toy) Silva Roque, e outros estudiosos da matéria terão elementos, e incito-os a responderem ao desafio lançado por Mário Fonseca, ou seja a colaborarem no resgate desta figura grande da literatura Cabo-verdiana, que descobriu e legou-nos códigos de decifragem da nossa identidade, circunstância que por si só, fazem-no merecedor de outro tratamento, que não aquele que lhe demos até agora.
No mínimo injusto, diga-se de passagem, para com quem, em tão curta estada na terra, deu tanto, em circunstância difícil, acometido por doença grava e em plena ditadura Salazarista.
Se calhar não será demais referir que na cidade do Mindelo, sujeito à censura e perseguição do regime, ousou empenhar-se na criação de um sindicato para defender os interesses da classe dos comerciantes.
Viveu seus últimos dias na passagem - Vila da Ribeira Brava, na casa assinalada na foto ao lado, de onde partiu no dia 24/09/1942 para o cemitério de Tabuga, deixando esposa e cinco filhos desamparados, que em meio a dificuldades, viram-se forçados a regressarem à ilha do fogo, à exceção do filho Osvaldo, que foi morar, primeiro com a tia Maria dos Anjos em Pico-Agudo - (Vale de Fajã), depois com os tios Nhô Rudolfo e Nhána Dadóia em Manel Anton - (Rª Brava).
Só posso desejar que não se trate de mera pedrinha no charco mas de um autêntico pedregulho no lamaçal do pântano da indiferança colectiva...
ResponderEliminarBraça, de esperança,
Zito