terça-feira, 11 de fevereiro de 2014

[0744] Notícias de São Nicolau - Uma iniciativa meritória que honra a cultura de Cabo Verde - VEJA OS QUATRO RECENTES POSTS ANTERIORES

Proteger o património cultural de um país é isto também!



Dois poemas de Pedro Corsino de Azevedo (1905-1942)

TERRA-LONGE

Aqui, perdido, distante
das realidades que apenas sonhei,
cansado pela febre do mais-além,
suponho
minha mãe a embalar-me,
eu, pequenino, zangado pelo sono que não vinha.

"Ai, não montes tal cavalinho,
tal cavalinho vai terra-longe,
terra-longe tem gente-gentio,
gente-gentio come gente."

A doce toada
meu sono caia de manso
da boca de minha mãe:

"Cala, cala, meu menino,
terra-longe tem gente-gentio
gente-gentio corne gente."

E envelheceu lá dentro
Não posso conceber
O que vêem as meninas
Dos meus olhos
Depois que sou livre.

Abrolhos são flores,
Amores, vida.
0 que é a magia da sombra!...

Agora já posso gritar:
Livre! Livre!

Tapei o poço da morte, a cantar.


CONQUISTA

Trás!...
Explodiu a Verdade,

Agora sou capaz
De tudo
Indiferente e quedo e mudo
Deixarei escangalhar o brinquedo
Que temi na Infância,
Rasgou-se o céu em mil fatias lindas,

Ricos
Fanicos
Que recolhi na mão.

Desilusão!
Cristal, cristal, cristal!

E eu a namorar o mal...

6 comentários:

  1. Esse assunto interessa-me sobremaneira, uma vez que minha familia do lado materno e toda da Praia Branca - S. Nicolau. Ja algumas vezes pensei na possibilidade de descobrir como e que esse Povoado nasceu. Talvez o Edil do Tarrafal poder algo fazer nesse sentido, uma vez que ele tambem tem la suas origens. A ver vamos no que da.
    Nita Ferreira

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  2. Se cada Edil dos nossos Municípios adoptar o sistema de valorizar os seus filhos municipes, contribuem para a educação dos jovens ou para lembrar aos que esqueceram os que, de uma for ou de outra, se notabilizaram e enriqueceamr a nossa Historia.

    Já é mania sobressairmos os factos ou nomes de estrangeiros, alguns até que nada têm a ver connosco, e desprezar o que é nosso, algumas vezes por eles pertencerem a tal ou tal lugar. Lembrem-se que, por bem ou por mal, somos todos filhos da mesma terra: - Duarte Silva, Januàrio, Eugénio, Jorge Barbosa, Cardoso, Cesària, Ildo, Pantera, etc. foram todos caboverdianos.

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  3. Este edil do Tarrafal parece apostado em lançar uma pedra no pântano em que as coisas cabo-verdianas ficam muitas vezes atoladas e inertes, para mal da nossa gente. Ele já me tinha enchido as medidas quando se meteu pelas estradas e cutelos fora para ver com olhos de ver a realidade dos seus munícipes. Não delegou, foi ao encontro das pessoas mais desprotegidas, ouvi-las, fazer-lhes ver que o poder não é coisa abstracta, distante e estática. Na altura, questionei até onde e até quando conseguiria ele manter semelhante pedalada de vitalidade e entusiasmo, sabendo-se, como se sabe, que não faltam casos deste género em que o fôlego inicial tem apenas a duração do fogo de artifício.
    Mas depois disso fomos tendo sinais de iniciativas a demonstrar que o homem é assim mesmo, não brinca em serviço. Tanto precisamos de autarcas e governantes deste quilate!
    Agora tem esta louvável iniciativa de reprojectar e honrar como merece a memória de Pedro Corsino de Azevedo, um poeta tarrafalense que merece ser estudado, apesar da sua pouca produção.
    Este edil é daqueles que eu gostaria de conhecer e abraçar. Quem sabe, um dia...

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  4. Achei interessante relembrar um texto de José J. Cabral publicado no A Semana de 13 de Fevereiro de 2013, sobre este poeta:
    Sanicolaense (Patchê), como ele, poderei ser acusado de puxar a brasa para à minha cavala, ao reclamar melhor estatuto e tratamento dessa figura notória da nossa história e cultura, esquecida ou simplesmente ignorada.
    Então, faço uso das palavras do saudoso Dr. Mário Fonseca, que numa eloquente intervenção, lembrou-se de Pedro Corsino d’Azevedo, descrito como “ Um poeta claridoso, que foi colocado um tanto à margem, e que, apesar de ter morrido com apenas 37 anos, e ter deixado somente oito poemas publicados, teve uma poesia não de adolescente mas lúcida e adulta. Por isso ele fez um apelo aos investigadores que o estudassem melhor e procurassem mais poemas que o poeta porventura possa ter deixado.”” …
    Ou de então, de uma declaração proferida durante o simpósio realizado sobre “Cabo Verde, a Europa e o legado de Amílcar Cabral”, em que se afirmou:
    No processo de construção da Cabo-verdianidade, houve vários momentos:
    “ O primeiro protagonizado do lado cabo-verdiano, fundamentalmente por escritores, dentre os quais se destacam, no primeiro os “nativistas” (Eugénio Tavares, Pedro Cardoso, José Lopes), … e no segundo, pelos fundadores do “Movimento Claridoso “ - (Baltasar Lopes, Jorge Barbosa, Manuel Lopes, João Lopes, Pedro Corsino d’Azevedo) ;
    O apelo de Mário Fonseca parece ter caído em orelhas moucas, porquanto se desconheça qualquer estudo aprofundado. Independentemente disso considero que os dois pressupostos referenciados justificam por si só a perpetuação da memória deste, entre outros ilustres Cabo-verdianos esquecidos.
    Da linhagem dos Lopes da Silva, ostenta o apelido Azevedo, resultado de uma longa peripécia familiar, aliás contada pelo filho Osvaldo no jornal Art & Letra.
    (Continua)

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  5. (Contiunação)

    Nasceu em Praia Branca no dia 4 de Fevereiro de 1905 (Completaria 108 anos), filho de José Maria Cabral d’Azevedo, que foi professor na Praia Branca, sob cuja responsabilidade funcionou uma escola régia, nos anos letivos de 1884/85 a 1886/1887.
    Seus três anos de frequência do seminário, terão propiciado-lhe embasamento intelectual e académico para suporte de sua sensibilidade inata, de poeta mítico e perspicaz, que nos legou poemas, (infelizmente poucas conhecidas), dominadas pela tensão entre o presente e o ausente, com traços de onirismo e evasão.
    Dedicou-se à atividade comercial, no exercício da qual visitou a ilha do Fogo, onde enamorou-se da jovem Ana Zazá, com quem esposou e teve cinco filhos, entre os quais o major, escritor, poeta Osvaldo Aranta Azevedo (Também ele ignorado), não obstante tratar-se de figura notória que, ao lado de Amílcar Cabral, combateu nas matas da Guiné, pela independência de Cabo Verde.
    Quis a sorte que seus últimos anos da atribulada vida fossem vividos em seu torrão, onde entre outras tarefas, dedicou-se ao ensino. Em Tarrafal, lecionou no ano letivo 1938/39, uma turma de 15 alunos, dos quais, Djódja Fina, que aos 86 anos, viva e lúcida recorda o “professor - Nhô Pedrinho”, hóspede de Nhô Djilipse, e ensinava-lhes numa casa que se situava onde é hoje a alfândega, junto ao porto de Tarrafal.
    Em estudo publicado, Manuel Ferreira afirma que foi ele, quem modificou a poesia Cabo-verdiana, no conteúdo e na forma. Por isso, atribuiu-lhe o estatuto de pai da moderna poesia Cabo-verdiana. Porém, não sendo minha seara, não me atrevo a escrever. António (Toy) Silva Roque, e outros estudiosos da matéria terão elementos, e incito-os a responderem ao desafio lançado por Mário Fonseca, ou seja a colaborarem no resgate desta figura grande da literatura Cabo-verdiana, que descobriu e legou-nos códigos de decifragem da nossa identidade, circunstância que por si só, fazem-no merecedor de outro tratamento, que não aquele que lhe demos até agora.
    No mínimo injusto, diga-se de passagem, para com quem, em tão curta estada na terra, deu tanto, em circunstância difícil, acometido por doença grava e em plena ditadura Salazarista.
    Se calhar não será demais referir que na cidade do Mindelo, sujeito à censura e perseguição do regime, ousou empenhar-se na criação de um sindicato para defender os interesses da classe dos comerciantes.
    Viveu seus últimos dias na passagem - Vila da Ribeira Brava, na casa assinalada na foto ao lado, de onde partiu no dia 24/09/1942 para o cemitério de Tabuga, deixando esposa e cinco filhos desamparados, que em meio a dificuldades, viram-se forçados a regressarem à ilha do fogo, à exceção do filho Osvaldo, que foi morar, primeiro com a tia Maria dos Anjos em Pico-Agudo - (Vale de Fajã), depois com os tios Nhô Rudolfo e Nhána Dadóia em Manel Anton - (Rª Brava).

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  6. Só posso desejar que não se trate de mera pedrinha no charco mas de um autêntico pedregulho no lamaçal do pântano da indiferança colectiva...
    Braça, de esperança,
    Zito

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