Depois da imagem colocada no post anterior, nada melhor que relembrar o comércio de bananas entre Cabo Verde e Portugal, nos tempos de diazá. O País come hoje bananas da Colômbia, do Equador e da Madeira (pelo menos), mas consumi-las-á ainda provenientes da antiga colónia? Eu, se visse num supermercado a marca "Cabo Verde" nos saborosos frutos, não hesitaria um segundo.
Vejamos então uma pequeníssima parte da comunicação feita em 15 de Novembro de 1972 pelo Governador de Cabo Verde, brigadeiro António Lopes dos Santos ao Conselho Legislativo de Cabo Verde, na Praia (contida no livro "Progresso apesar da seca", em edição da Agência Geral do Ultramar, publicado em 1973, com 95 páginas de texto, gráficos e índice que hoje nos chegou às mãos, 4.º da série que já temos da autoria do brigadeiro, todos referentes ao arquipélago e à acção deste militar que amou Cabo Verde).
Juntamos a este bananal um texto nosso de 09.11.2006 (antigo "Liberal") e a capa e uma referência a esse mesmo texto existente numa tese de licenciatura em engenharia rural feita em Cabo Verde sobre doenças da bananeira (2008) que muito nos honra.
Juntamos a este bananal um texto nosso de 09.11.2006 (antigo "Liberal") e a capa e uma referência a esse mesmo texto existente numa tese de licenciatura em engenharia rural feita em Cabo Verde sobre doenças da bananeira (2008) que muito nos honra.
Banana de Cabo Verde no mercado da Praia - Foto Wikipedia |
Texto de António Lopes dos Santos
A banana de Cabo Verde, que já se impõe pela sua qualidade, à preferência do consumidor metropolitano – Cabo Verde é o segundo abastecedor do mercado metropolitano – carece para sua expansão no mercado externo, de melhores condições comerciais, que podem ser obtidas, nomeadamente, através de transporte e embalagens adequadas.
A experiência, já tentada, do
afretamento de barcos estrangeiros, não resultou, porque a produção, afectada
pela irregularidade dos transportes, não atingiu o nível que evitasse o
pagamento de fretes mortos.
A solução deste problema terá,
pois, de ser encontrada através da utilização de barcos que sirvam outras
províncias e estejam equipados para drenar, em boas condições, o progressivo
aumento da produção bananícola cabo-verdiana.
Texto de Joaquim Saial
CABO VERDE, MERCADO ABASTECEDOR DE FRUTAS
Não se trata de piada, nem a ideia é de agora – contudo realizável, diga-se, em abono da verdade. A afirmação lê-se num texto de primeira página do «Diário Popular», de Março de 1956, da autoria do Dr. Luís Terry, figura que teve várias ligações a Cabo Verde, entre as quais se conta a de reitor do mindelense Liceu Gil Eanes.
O articulista começava, como quase sempre neste tipo de artigos de propaganda das virtualidades das ilhas, por argumentar com o panorama humano: «Embora a vida seja árdua, Cabo Verde não é árido de sugestões: - um panorama humano rico de valores espirituais, com uma música característica dolente e saudosa; um paisagem literária de incontestável autenticidade, brotando das várias camadas sociais; uma obra de miscigenação deu resultados exemplares com absoluta ausência de preconceitos raciais (afirmação peremptória, mas exagerada, como sabemos) e uma alegria resignada e imanente.»
Depois, Terry lembrava que virtualmente o arquipélago sempre fora um mercado abastecedor de frutas mas que para o ser em toda a sua plenitude teria de ultrapassar alguns (poucos) obstáculos, nomeadamente na área dos transportes inter-ilhas. E citava o principal fruto do arquipélago, a banana. Enaltecia a qualidade da banana cabo-verdiana em relação à de outras origens e falava do interesse crescente entre os europeus por este fruto, caso da França que a chegava a importar da Guiana, e da Inglaterra, onde a cotação era cerca de 30$00 a dúzia (como termo de comparação, 10 anos depois, em 1965, 30$00 era o preço de um quilo de lagosta em Cabo Verde). Luís Terry divulgava que só a Ribeira de Paul de Santo Antão podia na altura produzir uns duzentos mil cachos anuais – que juntos aos da Ribeira das Patas, Janela, Pombas, Ribeira Grande e Tarrafal do Monte Trigo ascenderiam a 750 mil cachos. Mas além de Santo Antão, também São Nicolau, Brava e Santiago estariam em condições de exportar. Até o Sal, onde na Pedra de Lume havia terrenos calcários «dolomitas», extremamente adequados à produção de banana.
E Terry acrescentava a anona, a pinha, o abacate e o ananás, que se davam espontaneamente em Cabo Verde, como também passíveis de exportação de elevado nível. Mas mereciam-lhe especial atenção a manga – com possibilidades de colocação na metrópole e na Europa, embora fosse preciso melhorar o fruto através de enxertia que poderia ter como base a manga de Goa – e os citrinos que em Santo Antão poderiam atingir dois mil contos anuais, com base em dados na altura já antigos, de 1936.
Era então possível que Cabo Verde pudesse exportar frutas no valor de pelo menos vinte mil contos no curto período de cinco anos, com incremento até cinquenta mil. Isto se se criasse um organismo para planificar e garantir a execução de um programa que inevitavelmente teria de incluir moderno sistema de frio e crédito bancário para os produtores que se decidissem investir na área.
Por esta altura, o comércio de banana na Madeira orçava em cerca de oitenta mil contos. Mas segundo o autor do texto esse arquipélago não precisava de temer a concorrência de Cabo Verde, antes pelo contrário – associada a ela, a produção de Cabo Verde iria decerto conseguir melhores quotas de exportação para o estrangeiro, onde o mercado era maior e as vendas melhor remuneradas. E terminava recomendando a aquisição de fruta ao pequeno produtor, e que os trabalhos de embalagem, transporte e outros não deixariam de influir no sucesso da ideia que propunha.
A ideia era tornar o arquipélago num grande mercado abastecedor de frutas. Mas não foi isso que aconteceu nos anos seguintes. Por todos os 60 e primeiros 70, só a banana teve algum peso nas exportações cabo-verdianas, sobretudo para Portugal. Anonas, abacates e ananases, iam para Portugal quase só da Madeira. Quanto à manga – cujo consumo só bem mais tarde se generalizou na potência colonial –, que em Cabo Verde era saborosa mas muito pequena, ficaria mais ou menos confinada ao território ilhéu, com o carinhoso nome de “manga di terra” o que diz bem do raio de acção que à data conseguia atingir.
NOTA: O pedagogo e publicista Jorge Diogo Luís Terry de Sousa Pinto, natural de Revorá, Bardez, Índia Portuguesa, faleceu em 7 de Junho de 1960, com apenas 51 anos de idade, de doença incurável. Está sepultado no cemitério da Ajuda, Lisboa. Pertencia à data da morte ao quadro de professores do Liceu de Pedro Nunes. Era co-autor do célebre manual de Organização Política e Administrativa da Nação que se leccionava nos últimos anos do liceu.
Texto de Joaquim Saial
CABO VERDE, MERCADO ABASTECEDOR DE FRUTAS
Não se trata de piada, nem a ideia é de agora – contudo realizável, diga-se, em abono da verdade. A afirmação lê-se num texto de primeira página do «Diário Popular», de Março de 1956, da autoria do Dr. Luís Terry, figura que teve várias ligações a Cabo Verde, entre as quais se conta a de reitor do mindelense Liceu Gil Eanes.
O articulista começava, como quase sempre neste tipo de artigos de propaganda das virtualidades das ilhas, por argumentar com o panorama humano: «Embora a vida seja árdua, Cabo Verde não é árido de sugestões: - um panorama humano rico de valores espirituais, com uma música característica dolente e saudosa; um paisagem literária de incontestável autenticidade, brotando das várias camadas sociais; uma obra de miscigenação deu resultados exemplares com absoluta ausência de preconceitos raciais (afirmação peremptória, mas exagerada, como sabemos) e uma alegria resignada e imanente.»
Depois, Terry lembrava que virtualmente o arquipélago sempre fora um mercado abastecedor de frutas mas que para o ser em toda a sua plenitude teria de ultrapassar alguns (poucos) obstáculos, nomeadamente na área dos transportes inter-ilhas. E citava o principal fruto do arquipélago, a banana. Enaltecia a qualidade da banana cabo-verdiana em relação à de outras origens e falava do interesse crescente entre os europeus por este fruto, caso da França que a chegava a importar da Guiana, e da Inglaterra, onde a cotação era cerca de 30$00 a dúzia (como termo de comparação, 10 anos depois, em 1965, 30$00 era o preço de um quilo de lagosta em Cabo Verde). Luís Terry divulgava que só a Ribeira de Paul de Santo Antão podia na altura produzir uns duzentos mil cachos anuais – que juntos aos da Ribeira das Patas, Janela, Pombas, Ribeira Grande e Tarrafal do Monte Trigo ascenderiam a 750 mil cachos. Mas além de Santo Antão, também São Nicolau, Brava e Santiago estariam em condições de exportar. Até o Sal, onde na Pedra de Lume havia terrenos calcários «dolomitas», extremamente adequados à produção de banana.
E Terry acrescentava a anona, a pinha, o abacate e o ananás, que se davam espontaneamente em Cabo Verde, como também passíveis de exportação de elevado nível. Mas mereciam-lhe especial atenção a manga – com possibilidades de colocação na metrópole e na Europa, embora fosse preciso melhorar o fruto através de enxertia que poderia ter como base a manga de Goa – e os citrinos que em Santo Antão poderiam atingir dois mil contos anuais, com base em dados na altura já antigos, de 1936.
Era então possível que Cabo Verde pudesse exportar frutas no valor de pelo menos vinte mil contos no curto período de cinco anos, com incremento até cinquenta mil. Isto se se criasse um organismo para planificar e garantir a execução de um programa que inevitavelmente teria de incluir moderno sistema de frio e crédito bancário para os produtores que se decidissem investir na área.
Por esta altura, o comércio de banana na Madeira orçava em cerca de oitenta mil contos. Mas segundo o autor do texto esse arquipélago não precisava de temer a concorrência de Cabo Verde, antes pelo contrário – associada a ela, a produção de Cabo Verde iria decerto conseguir melhores quotas de exportação para o estrangeiro, onde o mercado era maior e as vendas melhor remuneradas. E terminava recomendando a aquisição de fruta ao pequeno produtor, e que os trabalhos de embalagem, transporte e outros não deixariam de influir no sucesso da ideia que propunha.
A ideia era tornar o arquipélago num grande mercado abastecedor de frutas. Mas não foi isso que aconteceu nos anos seguintes. Por todos os 60 e primeiros 70, só a banana teve algum peso nas exportações cabo-verdianas, sobretudo para Portugal. Anonas, abacates e ananases, iam para Portugal quase só da Madeira. Quanto à manga – cujo consumo só bem mais tarde se generalizou na potência colonial –, que em Cabo Verde era saborosa mas muito pequena, ficaria mais ou menos confinada ao território ilhéu, com o carinhoso nome de “manga di terra” o que diz bem do raio de acção que à data conseguia atingir.
NOTA: O pedagogo e publicista Jorge Diogo Luís Terry de Sousa Pinto, natural de Revorá, Bardez, Índia Portuguesa, faleceu em 7 de Junho de 1960, com apenas 51 anos de idade, de doença incurável. Está sepultado no cemitério da Ajuda, Lisboa. Pertencia à data da morte ao quadro de professores do Liceu de Pedro Nunes. Era co-autor do célebre manual de Organização Política e Administrativa da Nação que se leccionava nos últimos anos do liceu.
Como sempre, chega-se em Cabo Verde sempre atrasado e perde-se o comboio. Só agora é que se está a ser dado alguns passos na mobilização de água, numa agricultura mais adequado a nossa realidade com novas sistemas de rega (gota gota), e algum marketing, mas falta o essencial, ( uma cultura empresarial e instituições de apoio financeiro).
ResponderEliminarFoi um gosto ler estes textos que o Djack nos proporcionou. Quanto a banana, a de Cabo Verde, assim como a da Madeira (e cuidado que também a dos Açores, que também a produz, embora em pequena escala), são mais saborosas do que as que são importadas da América Central. Estas são de tamanho grande, mas não as aprecio. Quanto ao resto, penso que em matéria de produção agrícola muito mais se podia ter feito em Cabo Verde, quer antes como depois da independência. Desperdiçou-se muito dinheiro em investimentos improdutivos ou que não resultaram, quando a agricultura podia ter sido a primeira prioridade. Sobre isto, o Arsénio de Pina já produziu matéria de muito interesse, mas a que ninguém tem ligado. Por isso é que ele costuma dizer: ês ca ta cdi.
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