quarta-feira, 3 de fevereiro de 2016

[1858] Mais um livro para a nossa biblioteca cabo-verdiana, o estabelecimento de nhô Césa e o Café Lisboa...

Arribei pela segunda de três vezes a São Vicente a 19 de Julho de 1999, à tarde, depois de ter chegado ao Sal na noite de 17 para 18. E logo na manhã de 20 (uma terça-feira), já estava na Biblioteca Municipal, para consultar um livro de cuja existência tinha tomado conhecimento em Portugal e se revelaria extremamente importante para o trabalho de pesquisa que tinha entre mãos na altura, relacionado com o romance "Capitania". Copiei febrilmente diversas partes dele, em longos apontamentos que ainda guardo e tentei de todo em todo adquirir no Mindelo a obra. Em vão. Estava mais que esgotada, embora a edição fosse relativamente recente, de 15 anos antes, 1984. 

Tratava-se de "Linhas Gerais da História do Desenvolvimento Urbano da Cidade do Mindelo", edição do Fundo de Desenvolvimento Nacional – Ministério da Economia e das Finanças mas publicado pelo Ministério da Habitação e Obras Públicas de Cabo Verde. 3000 exemplares, coisa rara mas logo desaparecidos em gostosa compra de nacionais e estrangeiros interessados pelos assuntos das ilhas verdianas, sobretudo da do Monte Cara – menos eu, que não soube logo da coisa e não me precavi com um dos books. Com execução gráfica da Filográfica, Lisboa, o livro não tem autor determinado e resulta de entrevistas, informações e colaborações diversas, de figuras de grande prestígio da cidade do Mindelo.

Posto isto, andei 17 anos atrás do importante manual de 188 páginas. Pelo meio, comprei o também significativo e complementar "Mindelo – Património Urbano e Arquitectónico – Assentamento Urbano e os seus Protagonistas", de João Sousa Martins, ed. Caleidoscópio, Casal de Cambra, Portugal, 2010 (20 €). Até que…

…há dias o vi à venda no OLX por 17€. Vitória, vitória, acabou-se hoje a história, altura em que FINALMENTE o livro se juntou aos seus colegas da minha biblioteca cabo-verdiana. Muito ele há-de servir ao Praia de Bote, começando já hoje a render… (palavras nossas entre parêntesis rectos)

Casa César Gil

Entre o antigo Mercado Municipal e o Café Royal há esta casa, construída pelo comerciante e lavrador César Gil, que também abastecia navios do porto. Tinha loja e moradia neste edifício, que foi construído logo no início do século [XX], por volta de 1905. [há algumas décadas, está ali instalado o famoso Café Lisboa, inevitável local de peregrinação de quem vem ao Mindelo].

Mas a stóra não acaba aqui. Este nome de César Gil ficou a martelar-me na cabeça. César Gil, César Gil, eu conhecia o sujeito, mas de onde?… Pouco tempo depois, ao cabo de vasculhar o arquivo durante uns cinco minutos, dei com um anúncio já aqui divulgado e que o apresentava como comerciante na Rua de Lisboa. Afinal, o César Gil era o César Gil dos Reis, de facto homem da Rua de Lisboa e de variado comércio, Aqui fica a propaganda, para quem tiver máquina do tempo e quiser voltar atrás, aí a 1913 (ano do anúncio, existente no Futuro de Cabo Verde) para comprar algo na locanda de nhô Césa… Repare-se que as hortaliças, batatas e cebolas deviam ser produção sua, sendo ele lavrador, como refere o livro que hoje me chegou.

É isto que faz o Praia de Bote e é este o profundo gozo que dá relacionar acontecimentos da cidade do Porto Grande, apanhados aqui e ali, até a presente stóra. E quando entrar no Café Lisboa, para um whisky, um gin-tonic, um grog ou um cirvijinha gelóde, pergunte se é ali a loja de nhô Césa Gil dos Reis. Veremos o que lhe responderão...

12 comentários:

  1. No primeiro andar deste edifício morou o José Fortunato Abu-Raya e família, na loja do rés-do-chão comerciou o Eloi Neves, que importava da Holanda, entre outras coisas, uns pés de porco em salmoura que eram uma delícia...Quanto ao livro, parabens e que lhe faça bom proveito, como a mim fizeram...os pés de porco do Eloi...

    ResponderEliminar
  2. PEÇO DESCULPA...POR FAVOR LER JORGE GREGO (GEORGIOS KARANTONIS) EM VEZ DO FORTUNATO, QUE MORAVA NA PERPENDICULAR, AO LADO DO MERCADO...

    ResponderEliminar
  3. Mais umas achegas para a história da Rua de Lisboa. O livro já merecia actualização, 32 anos após a primeira. Pode ser que um dia ainda venham falar connosco.

    Braça rodoviária lisboeta-mindelense
    Djack

    ResponderEliminar
  4. Felicito o Joaquim por esta importante aquisição. E felicitemo-nos também a nós pelo proveito que vamos garantidamente obter daí, pelo empenho e boa vontade do Joaquim. A publicação deve estar recheada de factos muito importantes e úteis ao nosso conhecimento.

    ResponderEliminar
  5. César Gil dos Reis, que conheci já velhinho de bigodes e o que lhe restava de cabelos brancos como algodão, era conhecido por Nhô-Césa-Cabeça-Pelada. Velhinho simpático que nos vendia as "tambla passada" sempre sorridente. Não me lembro quantos filhos teve mas pelo menos um rapaz e uma filha, professora, que veio a ser a segunda mulher do prof. Eurico Teixeira, um dos três fundadores do Curso de Admissão aos Liceus.
    Se o professor era reconhecido pela sua competência, também o era por abusado. Fui seu aluno na 1a classe e no Curso e sou um dos que não guardam boas lembranças.
    Os dois outros colegas - Amaral e Carvalho - ficaram também ligados à História do Mindelo. Amaral aposentou-se e criou um comércio na Rua de Lisboa (face à Ourivesaria Azevedo). O sr. Carvalho esposou a irmã de Manuel Matos (Aurora) e residiam numa das residências no interior da Fábrica Favorita; foram pais de 4 encantadores moças todas professoras e cabo-verdianas de sete costados: Genny, Lourdes, Aurora e Zoraida.
    Delas que venham falar os outros, talvez seus alunos.
    Braças com lembranças
    V/

    P.S. - Djack: - Tude galinha que esgrovetà ta otchà midje.

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Tambem frequentei esse "curso" com os mesmos três professores...Aliás,o Carvalho já tinha sido meu professor na 3ªclasse da Escola Camões e gostava de nos castigar as orelhas com uma vara de tâmara...Doía p'ra caraças!
      Braça dolorido
      Zito

      Eliminar
    2. Acerca do ditado do Val, só posso dizer: "Êss li já m'sabia", ahahahahaha!!!
      Quanto à Aurora "Lola" Matos, foi minha professora de matemática no longínquo ano lectivo de 1962-63, no meu primeiro ano de Gil Eanes. Nesse ano ou no seguinte comprou um lindíssimo Ford Anglia Fascinante vermelho (daqueles com o vidro posterior dobrado para dentro) que era uma beleza de ver.

      Braça rememorativa,
      Djack

      Eliminar
  6. Eu não me lembro desses professores, mas o curioso é que me lembro desse nome que o Val cita: nhô Césa cabeça pelada.

    ResponderEliminar
  7. É uma obra de referência! Apenas acrescento que a autoria do trabalho é de Brita Papini.
    Carmo Daun e Lorena

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Cara Carmo,
      O que vem referido no prefácio é "Num sector em que a bibliografia cabo-verdiana é confrangedoramente pobre, seja este trabalho de equipa, coordenado pela socióloga sueca Brita Papini (...)"

      Braça autoral,
      Djack

      Eliminar
  8. Mais um pedaço da história desta rua de Lisboa de comerciantes e chipchandlres. tenho a certeza que o Djack tal um bom arqueólogo vai continuar as suas buscar. Daria gozo a muitos se encontrasse vestígios de civilizações alienígenas que povoaram Mindelo há milénios, pois aparentemente os portugueses afastaram CV de Afric

    ResponderEliminar
  9. De facto, a vida e a lida comercial do antigamente na bela cidade do Mindelo e que era feita também e sobretudo com os olhos postos no movimento do seu porto, deve ser desafiador e fascinante para um historiador e mais, "menin de Saocente" como é o nosso Joaquim Djack. Bom trabalho!
    Abraços
    Ondina

    ResponderEliminar

Torne este blogue mais vivo: coloque o seu comentário.