Babosa, sim, senhor. Acerca da qual escrevi este poema publicado no meu primeiro livro editado, «Paraíso apagado por um trovão», 2003.
Ora a categoria do poema e do autor não permitem que aquele fique na zona de comentários e portanto aqui o colocamos com todas as honras habituais a material deste calibre.
Não eras flor de adorno,
inda auri-rubra reflorisses
pelos cariados muros
que a manhã descerra.
Qual puta da beira dos caminhos,
em árduos trejeitos te oferecias,
mas nos teus ranhos ressequias,
pobre madalena sem cristo
nem franjinhas.
Em latinório doutorão, de aloe vera
te crismaram, mas na redoma do que
me é mais íntimo amarguíssima babosa
serás sempre, a de baba rude e grossa,
santo remédio p’ra piolheira,
fado nosso de menino.
Tiveste honra de retrato
em catálogo de missão botânica,
alfenim de inocência entre dragoeiros
poltrões e rosinhas vulpinas
que nos tiram o sarro das narinas.
Foste minha frol de verde pino,
amor recidivo nos costados dessangrados,
mais profundos que os terrores que
em tinta a noite prescreve.
Mas, aonde a madrugada é susto,
te vejo posta em sossego,
então, suspirando, sou o pobre jonas
atirado às distantes praias do adeus.
José Luiz Tavares
Num mesmo comentário, felicito o Zeca Soares pelo foco oportuno e penetrante do seu olhar, ao mesmo tempo que felicito o José Luís Tavares pela rara beleza do seu poema. Enquanto o primeiro foca a singularidade da imagem exterior, o segundo encarrega-se da vibração interior da planta e da flor que dela desabrocha, celebrando o som do seu vagido e a luz que irradia na aspereza do ambiente à volta. Um hino à nossa bela língua.
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