José Fortes Lopes |
O novo Eden Park está com vento em popa.
Ontem 18 de Março de 2014, o arquitecto responsável pelo projecto, Carlos Hamelberg, fez a sua apresentação e realizou-se uma Conferência de Imprensa, no Mindel Hotel, presidida por Maika Lobo (INCO, SA), o advogado representante dos novos donos, para um debate alargado. Lembrem-se de que há cerca de um mês houve uma primeira apresentação do projecto. Tendo em conta o número de reacções nos vários blogues e no facebook, era previsível que o arquitecto tivesse em conta os diferentes pontos de vista para uma eventual restruturação do projecto. Por exemplo, sob o impulso de João Branco, houve um diálogo bastante construtivo no facebook no sentido da necessidade da revisão de vários aspectos do projecto, tanto relativamente à volumetria como à traça. Por outro lado, nos blogues Praia de Bote e Arrozcatum houve um debate no mesmo sentido, concluindo que o projecto era inaceitável na sua presente versão. Com os novos desenvolvimentos relativamente à parte traseira do edifício, constatamos que o arquitecto não teve em conta as opiniões contrárias e avançou para uma versão que me parece quase definitiva. Como é obvio e natural, o que esteve na base da compra do prédio Eden Park foi a intenção de um investimento, e hoje não deixa mínimas dúvidas, não obstante os desmentidos, que este é um projecto iminentemente imobiliário para rendibilidade financeira, um novo edifício constituído por várias torres gémeas destinado essencialmente a habitação, com algum espaço dedicado à cultura, quando a base do projecto deveria ser precisamente o inverso, pelo valor histórico que este edifício do Eden Park encerra, por estar situado no coração da cidade e pelo facto de o Centro Histórico do Mindelo ter sido classificado como património Nacional. Como podemos ler pela notícia de 19 Janeiro 2012, um anúncio ao povo mindelense foi efectuado no domingo, 22, dia do município de São Vicente, por Mário Lúcio Sousa, ministro da Cultura, durante a sessão solene em comemoração dos 550 anos do descobrimento da ilha do Porto Grande. ‘O Centro Histórico de Mindelo é agora património nacional de Cabo Verde, anunciou esta quinta-feira, 19, aos vereadores e presidente da Câmara Municipal de São Vicente, o director desta área do Instituto da Investigação e do Património Culturais. Com esta classificação a cidade do Mindelo passará a usufruir de um plano de preservação legal e valorização do seu património, que tem interesse histórico, arqueológico, artístico, científico e social, a ser elaborado em conjunto pelo Estado, autarquia e munícipes’. Não obstante esta realidade, até hoje, que eu saiba, não houve reacção nem pronunciamento sobre o assunto da parte de um único deputado nacional ou municipal mindelense, das autoridades camarárias e das autoridades competentes em matéria de património no país, quando são matérias sobre as quais, por dever e obrigação, deveriam pronunciar-se publicamente. Com a demolição deste edifício, é mais um bocado da história desta cidade que desaparece. Depois do monstro de vidro e metal que substituiu um dos prédios mais emblemáticos da cidade, a Casa Adriana, para dar lugar ao Centro de Saúde, agora será o memorável prédio que representava o ex-cinema Eden Park a ceder o seu lugar a um 'monumento ' de arte pós-moderna. Não se pode esquecer que esta cidade tem sido vítima nos últimos anos de um autêntico tsunami desenvolvimentista onde se abate ‘por da cá aquela palha’ bens patrimoniais mindelenses em troca de promessas demagógicas que têm redundado em malefícios para a ilha. A lista é longa e remonta aos primórdios da Independência com a demolição dos prédios da antiga Fazenda, da destruição da praia da Matiota (Lajinha que foi gato por lebre), da desfiguração do edifício da Câmara Municipal e, mais recentemente, edifícios emblemáticos como o Tribunal, o Café Royal, a Casa Adriana, o Miradouro, o Fortim, para além de vários outros edifícios anónimos que são abatidos pela calada da noite ou na indiferença geral. Para além disso, temos o edifício do Liceu, esse autêntico património de Cabo Verde, em estado de degradação avançada ante a indiferença total das autoridades. Temo que um dia haveremos de precisar destes patrimónios, das suas funcionalidades e diremos ah se soubéssemos ou as gerações vindouras nos acusarão de desleixo! Mas não foi sem avisar. Relativamente aos problemas de volumetria do novo edifício sobre que alertei o Arquitecto Halmelberg, ao lhe pedir entre outras coisas que nivelasse a obra para não ultrapassar no máximo um andar ao Hotel Porto Grande, ele informou-me de que foi a própria CMSV que aprovou uma extensão em altura do edifício Hotel Porto Grande, ficando assim salvaguardado contra uma eventual violação deste importante parâmetro, pelo que o nivelamento se fará a posteriori, estando esta área assim exposta a uma inflação das alturas, a uma autêntica corrida às alturas devido ao vazio ou à ausência de directivas claras da Câmara. Esta terá sido a filosofia da proposta de novo edifício tão descabido para a área. A situação anterior (estamos a falar até aos anos 2000) se caracterizava por um conjunto coerente na área em torno da Praça Nova, tanto em volumetria como em arquitectura, tudo se nivelando pelo Hotel e o Edifíco do antigo telégrafo inglês, numa harmonia arquitectónica quase perfeita. Com este novo edifício, rompe-se com a tal harmonia e cria-se um efeito dominó com reflexos potencialmente ruinosos para o património arquitectónico da cidade. Se este edifício for avante, nada mais parará a folia por obras deste tipo que irão invadir toda a cidade, pondo em risco o património histórico que é o seu centro. Estaremos perante uma autêntica revolução arquitectónica no centro do Mindelo.
Do ponto de vista legal o coração da cidade está agora protegido, não pode ser violado por obras deste tipo, volumetria e estilo que chocam com a sua traça. Portanto, o que se pede aos senhores deputados, políticos e intelectuais é que rompam o silêncio e façam aplicar a lei. Esta obra é ilegal aqui neste local (à luz da nova lei que elegeu o Centro Histórico de Mindelo Património Nacional de Cabo Verde) e vamos ver até que ponto é que se respeita a lei. Esta é uma oportunidade para fazer um grande teste de como se cumprem as leis e se as autoridades (o Ministério da Cultura, a Câmara Municipal de S. Vicente e o IPAR) e os actores políticos podem zelar para a sua observância. É possível um projecto moderno para o Eden Park, equilibrado e respeitador da lei e da história da cidade.
Eden Park - Foto José Carlos Marques |
Vamos ver, José, o que vai sair disto tudo. Permitir este desconchavo é enxovalhar aquele lugar. Mas como o problema de fundo é o do dinheiro, veremos como a Câmara vai sair disto, sendo certo que nenhuma expectativa favorável se pode criar relativamente à autarquia local, tendo em conta o silêncio e a aparente abstenção em que se meteu durante todo o processo de abandono do edifício.
ResponderEliminarBem, há ainda um aspecto a considerar. Com a classificação do centro histórico do Mindelo como património de Cabo Verde, cabe perguntar se o problema do Eden Park não ultrapassa a competência da Câmara de S. Vicente. Ou seja, a competência da Câmara só pode ater-se ao quadro legal estabelecido pelo governo, deixando de ter, assim, qualquer possibilidade de aprovar um projecto que afronte as disposições do diploma do governo. Poderemos assim cair numa situação de irónica singularidade, que é o governo central a curar da salvaguarda de um património cujo primeiro guardião deve ser a autarquia.
ResponderEliminarO Obama acabou de me telefonar a dizer que quer o Eden Park de volta, igualzinho ao que era nos tempos em que o Adriano, o Djack, o Zito, o Val e outros mais ali se regalavam a ver os filmes do John Wayne. Disse que se for preciso vai meter o Pentágono no assunto, mas que estranha ver a ausência de comentadores num assunto deste melindre.
ResponderEliminarQuando se fala do novo projecto do Eden Park, não se pode falar em arquitectura mas sim em pura especulação imobiliária. Ter um arquitecto no processo é um mero acaso.
ResponderEliminarEste projecto é uma cópia fraca dos projectos dos anos 80 que pairavam ( e o que resta deles ainda paira) na costa mediterrânea espanhola (Benidorm, Murcia, etc).
Com o tempo percebemos que essa fórmula foi um desastre, a nível urbano, paisagístico e está neste momento totalmente obsoleto tal é a falta de qualidade que apresenta.
É de lamentar que em 2014 não se tenha aprendido nada com os erros dos outros, quando estes estão bem visíveis e com consequências gravíssimas.
Não se protege o Património. Não se constrói Património. Mas ainda se fala em rentabilidade.
Quantos aparelhos de ar condicionado vão ser necessários pôr a funcionar para tornar habitável este espaço moderno, de vidro e ferro?
Ou será que tem um sombreamento super, ultra sofisticado?
Cuidado que a Electra falha muitas vezes!!!!!