Praia de Bote conta a partir de hoje com generosa colaboração de Luís Filipe Morazzo que nos irá brindar com relatos provenientes das suas investigações relacionadas com 29 afundamentos de navios aliados pela Armada alemã (os que até agora compilou), dos 38 conhecidos que tiveram lugar em águas de Cabo Verde durante a II Guerra Mundial. Este blogue, apenas interessado em assuntos cabo-verdianos, mormente os de São Vicente, fica assim sobremaneira enriquecido. Ao Morazzo, o agradecimento da praxe, em nome do blogue e dos leitores (os que nele participam e os que por inútil timidez apenas o lêem - o que de si já não é nada mau).
OCORRÊNCIA 1 - O Rad
|
Luís Filipe Morazzo |
O vapor
Rad era um velho cargueiro que apresentava um deslocamento bruto da ordem das 4201 toneladas, construído em 1910, como Thistletor para a famosa firma inglesa Albyn Line Ltd. nos conhecidos estaleiros Irvine’s Shipbuilding & Dry Dock Co. Ltd., Middleton, Inglaterra. Após ter navegado com pavilhão inglês durante 20 anos, unindo em particular os portos do sul de Inglaterra com os do Golfo do México e Rio da Prata, foi vendido em 1930, para a firma iugoslava, Plovidba Rad, com porto de registo em Dubrovnik. No dia 3.8.1940, quando navegava a cerca de 300 milhas a SE da ilha do Maio, fazendo a ligação Baltimore (USA) – Durban (Africa do Sul) com um pesado carregamento de químicos, foi mandado parar pelo submarino alemão
UA, comandado por Hans Cohausz depois de este ter ordenado díspar alguns tiros de artilharia como advertência. Em seguida a uma rápida vistoria à carga, e ter sido detetado uma grande quantidade de contrabando embarcado, foi de imediato ordenado o abandono do navio, por parte da sua tripulação (29 homens). Eram cerca das 20h15, quando um torpedo atingiu a meia-nau do velho navio, fazendo com que este se tivesse partido ao meio, provocando o seu afundamento em cerca de 15 minutos. Felizmente toda a tripulação do
Rad foi salva pelo mercante inglês
Grodno, que circunstancialmente navegava nas mesmas águas do acidente, transportando-os de seguida para Freetown.
|
Rad, ex-Thistletor |
Um relato que seduz ler a esta distância dos acontecimentos, pela riqueza do pormenor, mas que ao mesmo tempo confrange por ressuscitar a memória trágica de perdas de vidas humanas e meios de vida, como eram os navios e a sua carga. Neste caso concreto, não houve perda de vidas porque o humanismo e o respeito pelas leis da guerra por parte do comandante do submarino, pesou mais alto. É possível que na solidão do seu camarote, alguns comandantes de submarino reflectissem sobre o desvario demencial que essa guerra comportava.
ResponderEliminarCaro Adriano Lima
EliminarComeço por agradecer o seu interesse demonstrado pela minha crónica dedicada à segunda guerra mundial.
Você falou em humanismo e respeito pelas leis de guerra. Como sabemos estes valores devem nascer com as pessoas, embora haja convenções como a de Genebra que deixam muitos indicadores nesse sentido.
Vou-lhe dar dois exemplos de atitudes completamente antagónicas, tomadas por vários comandantes de submarinos, durante os dois grandes conflitos mundiais, quer fossem (ingleses, alemães, italianos, japoneses, americanos etc.), que provam o que eu acabei de mencionar.
Após os torpedeamentos dos navios inimigos, houve casos em que os comandantes ordenaram o reboque das baleeiras lotadas de sobreviventes, fazendo muitas vezes percursos de dezenas de milhas, com a finalidade de os deixar perto das costas, com o único propósito de facilitar a posteriori o seu salvamento. Infelizmente, embora tivessem sido raras, houve também ocasiões em que os sobreviventes foram puramente chacinados, depois de terem sido metralhados dentro das baleeiras.
Como vê estas atitudes tão díspares uma da outra, dependeram totalmente dos perfis psicológicos dos comandantes envolvidos nas ações militares, sabendo que depois de a guerra ter terminado, alguns dos comandantes que ajudaram os sobreviventes a salvarem-se, foram condecorados pelas marinhas oponentes durante o conflito, ao contrário dos outros, que após terem sido julgados em tribunal de guerra, foram de seguida fuzilados.
Luís Filipe Morazzo
Fica a pergunta, de até quando a humanidade vai ter o sentido e o respeito pelas leis da vida??
ResponderEliminarEm nome de que "Deus" se continua ainda em pleno século XXI com a destruição de formas de vida com e sem guerras declaradas pelas diversas partes do Globo. Será isso uma necessidade para o equilíbrio da sobrevivência da humanidade sobre o planeta Terra?
Isso faz-me confusão.
Agradeço ao Luís Filipe Morazzo a gentileza do seu esclarecimento. Apareça mais vezes neste blogue.
ResponderEliminarAproveito para rectificar um erro de concordância no meu comentário: "o humanismo e o respeito pelas leis da guerra por parte do comandante do submarino, pesaram mais alto". Tinha escrito pesou.