quarta-feira, 16 de março de 2016

[2028] José Eugénio Rodrigues, um homem do Fogo (e de categoria)

No seguimento de comentários ao post anterior, lembrei-me de um texto que escrevi há10 anos (30.11.2006) para o antigo "Liberal" de Cabo Verde e que agora reproduzo com algumas adaptações. Esperemos pela sabedoria ondinense que decerto acrescentará algo interessante a estas minhas palavras de há uma década.

PEQUENA NOTA SOBRE JOSÉ EUGÉNIO RODRIGUES, "O VELHO", COMERCIANTE, PROPRIETÁRIO, ARMADOR E AGRICULTOR MOSTEIRENSE

José Eugénio Rodrigues
Nascido em 1899, José Eugénio Rodrigues tornou-se conhecido como O Velho, mesmo quando cedo na vida ainda não o era. Foi conceituado homem de negócios de Mosteiros (norte da ilha do Fogo), de onde era natural, zona famosa pela produção de café de alta qualidade. 

Ora o nosso homem, que iniciara a sua precoce actividade mercantil com apenas 18 anos, era senhor da maior organização comercial da zona de Mosteiros, onde era respeitado e acarinhado por toda a gente. Comerciante, proprietário, armador de navios e até agricultor, transaccionava directamente com as grandes firmas metropolitanas os artigos que interessavam ao seu comércio e fazia o mesmo relativamente à exportação de produtos das suas propriedades agrícola, tais como café, rícino, purgueira, milho e feijão, entre outros.

Viajado, José Eugénio Rodrigues esteve em Portugal continental e noutros países europeus, sempre com a avidez do conhecimento que lhe podia proporcionar progressos na actividade a que se dedicava. E sempre vendo a ligação à terra e à agricultura como principal motor de desenvolvimento da mesma. Através desses múltiplos contactos percebeu que só poderia prosperar com um eficaz sistema de comunicações, sobretudo nas relações entre as ilhas (algo deficientes nos meados do século passado), quando estas quase só eram servidas por veleiros de cabotagem que utilizavam pequenos motores como auxiliares do principal meio de propulsão, o vento.

O "Boas Novas"/"Pombinha Branca"
O seu primeiro barco, o "Palmerlina", fora adquirido de sociedade com o pai, o também comerciante António José Rodrigues, para transporte de cargas e passageiros entre as ilhas de Barlavento e de Sotavento do arquipélago. Alguns anos depois adquiriria em S. Vicente o cutter a motor e vela "Boas Novas", de 24 toneladas, para a ligação regular entre o Fogo, a Brava e Santiago e para as viagens de Sotavento para Barlavento. E diga-se, em abono da simpatia que se deve a este homem, que quando era necessário e urgente um medicamento cujo destino se situasse numa das rotas do seu barco, José Eugénio o entregava não cobrando nada pelo frete.

Mas este empreendedor, sempre com a ideia de melhorar as comunicações entre as ilhas, ainda pensou na aquisição de uma aeronave ou helicóptero que permitisse maior facilidade e sobretudo rapidez nas ligações. Por informações de amiga nossa, parece que O Velho não chegou a realizar esse sonho que divulgava na imprensa em 1954. E que afinal tinha razão para acalentar, dado que desde 15 de Maio de 1949 o Sal possuía o seu aeroporto e que portanto o arquipélago já estava nessa área com pelo menos cinco anos de experiência 

Seja como for, aqui fica o exemplo deste homem de visão larga que marcou a actividade comercial da ilha do Fogo durante várias décadas – e, pelas variadas ramificações do seu negócio, também as restantes ilhas de Cabo Verde.

3 comentários:

  1. É verdade, José Eugénio Rodrigues corresponde na íntegra à descrição aqui feita. Ora bem, o tio Velho, assim tratado por nós, era primo-irmão, ou primo direito, do meu pai Hugo José Rodrigues. Tratava-se de um familiar muito estimado e respeitado por todos dada a sua grande capacidade empreendedora e laboriosa que até o distinguia entre os Rodrigues da sua geração. Creio que mais tarde ele terá (re)baptizado o «Boas Novas» de «Ana José» em homenagem à cara-metade.
    Há muitas histórias à volta do seu nominho «Bedjo» ou «Velho». Sei de uma muito interessante, que se tiver vagar mandarei com prazer para o PdP. António José Rodrigues, meu tio-avô, irmão do meu avô Miguel José Rodrigues (todos os homens da família Rodrigues, levavam «José» no nome) mais conhecido por António de Nhanha (nome da mãe) era o homem mais rico do Fogo. Dos Mosteiros era-o de certeza. Ponha-se isso à escala e à dimensão da terra e do tempo. Reza a lenda, que num exame oral da 4ª classe, nos Mosteiros, o professor indagou um aluno: Quem é o Rei de Portugal? (na altura D. Manuel II) o examinando hesita em responder, ou não sabia. O professor resolve ajudá-lo; "Então? então? o rei é um homem muito rico, possui muitas terras, tem muito poder que se estende por um impé..." E antes que o professor terminasse a frase, precipitou-se o aluno: "Rei de Portugal? rico... tem muitas terras... eu já sei só pode ser António Nhanha!" Claro que a "raposa" apareceu na pauta. E o meu tio-avó passou a ser chamado no povoado (gozadamente e em surdina) de Rei de Portugal.
    Abraços terrunhos (da terrinha)

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  2. Mas que biografia e história interessantes o Djack e a Ondina nos contam. Vê-se que o José Rodrigues era efectivamente um homem com peso na ilha e um exemplo para o território. Esse episódio do exame é deveras hilariante.

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  3. Emmanuel C D'Oliveira - Monaya14 de maio de 2017 às 21:31

    Ja tinha ouvido falar do Bedjo di Mustero pela boca do Sr Samuel Oliveira, antigo policia maritimo de Furna, grande conhecedor de historias do mar de CV, meu parente. Ele até disse que o Bedjo di Mustero teria encomendado um orçamento a ver se trazia um helicoptero para CV e o que mais complicou foi a questão do combustivel que era muito e caro. Quanto ao Palmerina parece ter-se afundado nas imediações de Rincon, em Santiago. Procurei as minhas notas, não encontrei para confirmar. Ía da Ribeira Barca para Praia. Foi o que me contou o Sr Claudio Vieira que na altura era encarregado do barco Santa Rita que pertencia à familia.

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