sexta-feira, 10 de setembro de 2021

[5346] Texto de Veladimir Romano da Cruz sobre Jorge Sampaio

O "FURACÃO RUIVO"

Por Veladimir Romano da Cruz

Jorge Sampaio - Foto Visão-Sapo

Um dia nascemos, marcamos nosso caminho e partimos quando a Natureza entende que o veículo físico já não tem condições ou qualquer resistência. Aconteceu, um dos presidentes e prefeitos mais bem sucedidos depois da reforma política portuguesa, já no seu tempo dos anos de 1980, a revista norte-americana "Time", o elogiava e previa seu futuro de sucesso. Não foi somente sucesso, foi brilhante e, lamentavelmente, não se repetiu ao longo dos anos da sua herança bem republicana, dedicado às causas, não um mero político ou antes o diplomata da prática política, carismático, humanista, equilibrado, sereno, entregue ao sacrifício.

Contudo, nem sempre foi assim pelo quanto a Ditadura portuguesa obrigou vezes incontáveis em centros universitários quando a juventude das épocas difíceis obrigavam os mais determinados e corajosos irem ocupando semanas de luta, campanha, modos frontais pelo que o tempo nem dava para a criação estratégica deste combate contra o Fascismo. Dúvidas nunca teve, por isso, da sua juventude combativa contra a polícia do Regime, logo o apelido apareceu: conhecido como o "Furacão Ruivo", rapidamente entendeu que reformas e liberdade, são coisas que rimam com Democracia.

Não levou tempo quando criou a Iniciativa Socialista, depois o Movimento da Esquerda Socialista [MES], mas acabou fazendo lista nos quinze (15) camaradas fundadores do Partido Socialista [PS]. Abrir portas para que a velha República funcionasse no seu absoluto desígnio, não foi nada fácil. Entretanto o 25 de Abril, precipitou a luta e repôs a verdade que a maioria desejava, muito mais quem já via o trilho futurista. É então quando nasce outro Jorge Sampaio (1939-2021), secretário-geral do PS, verdadeiro idealista dos programas sociais, da transparência [dos que mais lutou], totalmente dedicado ao serviço público, respeito pela primazia das funções do Estado, homem grande pela Justiça e da extensão humana pelo bem.

Não é apenas o Prefeito cuidadoso e social quando entra na casa do cidadão apenas porque um cego deseja escutar sua voz ali perto e ele se aplica trazendo essa satisfação a qualquer cidadão/o, que precise do seu calor, atenção, cuidados... um aperto de mão sincero, pelo quanto de amor vive na sua alma. Por isso quando deixa a Câmara Municipal de Lisboa, o Palácio de Belém onde já moradia monárquica foi, depois alojamento das ditaduras [militar e civil], não resistiu ao processo democrático quando desta vez os militares foram reformistas contra uma guerra dividida a três capítulos: Guiné, Angola e Moçambique, eram já nações soberanas mas dominadas pelo falso entendimento dos dirigentes fascistas sonhando ainda a colonização que anunciava seu fim.

Depois de trinta (30) anos de serviço público, partidário, autárquico e político, de nota máxima, atravessando a fronteira, foi servir o Mundo. Instâncias internacionais de âmbito social e humano, chamaram por ele quando podia ir descansar na sua aposentadoria como fizeram alguns, mas ele não se susteve, avançou, fez a diferença. Já em idade avançada, voltou o "Furacão Ruivo", não querendo desiludir aqueles que acreditando nele, saberem das diferenças positivas, de boas intuições e clareza que na prática, Jorge Sampaio podia trazer. Ser Presidente da nação Lusa [1996-2006], não deixa ninguém indiferente tanto pelas polêmicas contra governos e governantes levados pelo aventureirismo; ele, com sua experiência, pensando no país e no povo, interveio de forma corajosa e determinante, ainda que alguns primeiro defendendo interesses pessoais ou de grupo, travou charadas de bastidor.

O Povo, a Nação, transparência, muito pensar, visto ser um resistente da velha guarda; sabia como revelar suas decisões depois de bastante pensamento, dividir com quantos se manifestassem capazes do diálogo, fugindo ou dominando prejuízos socialmente danosos.

Ainda que debilitado anunciando um corpo frágil chegando a hora da partida, deixa muita saudade porque a verticalidade de um homem público, da maior integridade, preocupado com o seu próximo, emocionado vezes sem conta e humilde, capaz de conhecer o esforço dos demais quando trabalham com empenho e dedicação, como na sua viagem presidencial até Finlândia, na hora do regresso, fazendo o balanço, ficou uma frase que infelizmente tanto a Imprensa portuguesa como muitos políticos responsáveis, nunca exploraram através das necessárias análises... quando ele afirma: «Gostaria que o meu Portugal pudesse ser uma Finlândia»... mas ficou na História.

Só grandes almas como Jorge Sampaio poderiam ambicionar um sonho deliberado num país que nos idos 1960, tinha 50% da sua pequena população emigrada nos países vizinhos da Escandinávia. Aos poucos, aprendendo, foi crescendo e se transformou numa sociedade exemplar, reformista e progressista. Por isso Jorge Sampaio, não teve vergonha nem absurdos do patriotismo bolorento, viajando milhares de milhas para ir contar aos finlandeses como os portugueses conquistaram oceanos, cantam fados, discutem desalmadamente o futebol comendo bolinhos de bacalhau junto ao bom tinto que lhes amadurece a coragem de lutar por um país mais sério e de sucesso. Ele partiu com vontade de ver essa ideia, mas fica o recado, agora é preciso alguém acreditar como ele mencionou com emoção... só mesmo o "Furacão Ruivo".       

7 comentários:

  1. Onde foi publicado este texto? É exclusivo do Praia de Bote?
    É bom constatar que o filho do nosso grande B. Leza tem em grande conta a memória do Jorge Sampaio, que infelizmente hoje nos deixou. Sampaio era um democrata genuíno e convicto, um homem de ideais elevados e de causas, um exemplo para os portugueses e que oxalá na memória colectiva.

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    1. Penso que, neste momento, o Pd'B é o único local onde o texto foi publicado. Chegou-nos directamente do autor, sem qualquer indicação de eventual local de publicação.

      Dkack

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    2. ...e ao qual muito agradecemos o oportuno envio.

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  2. Errei. Quis escrever: ... oxalá perdure na memória colectiva. Faltou "perdure".

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    1. Não há crise. Escrever aqui directamente dá muitas vezes origem a erros e gralhas (não se pode ver o texto todo, não se pode aumentar a letra, etc.). Quando é coisa maior, escrevo no word, depois copio e então é que lanço aqui.

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    2. E se por um lado podemos fazer emendas ao texto dos posts, não as podemos fazer em relação aos comentários. Já me tenho enganado num comentário, copio-o, apago o comentário, lanço de novo o antigo comentário (como se fosse novo) e emendo-o. Só então o dou como terminado e o publico. Mas em relação aos comentários dos visitantes, não posso fazer nada. Têm de ser eles a fazer com os deles, o que eu faço com os meus.

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  3. A morte de Jorge Sampaio merece ser aqui tratada e em boa hora o fez o Veladimir com o "Furacão Ruivo". Jorge Sampaio era um homem do mundo, pela dimensão do seu humanismo e pela sua luta permanente pela paz e pela justiça universais. Daí justificar-se inteiramente que ele seja hoje e aqui recordado, enaltecido e comentado, porque indubitavelmente ele seria solidário com tudo o que se faça a favor do povo cabo-verdiano.

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