Anúncio à obra de Manuel Lopes, em 24 de Dezembro de 1932. O livro fora publicado nesse mesmo ano, na Sociedade de Tipografia e Publicidade, Limitada, de São Vicente, Cabo Verde e tem uma pequena nota, espécie de explicação para o leitor, que aqui deixamos:
"...julguei-me no direito de traduzir o que vi e senti consoante a verdade do meu temperamento." A frase é de Aquilino Ribeiro, em "O homem que matou o diabo" e Manuel Lopes, neste caso, adoptou-a como sua e muito bem, aliás.
São 20 páginas de texto e mais uma de post-scriptum de três parágrafos que também aqui fica:
«Releio o que acabo de escrever sobre o Paúl- Acho-o muito sintético, muito pobre, muito incompleto.
Mas não desejo tocar em uma única frase, não desejo modificar nada que, num acto febril, foi aqui traçado. Não quero simplesmente mutilar a emoção que m'o ditou, porque, se esta reportagem nervosa e imperfeita foi escrita, obedeci unicamente à necessidade irresistível de expandir a impressão imediata que aquela paisagem transmitiu - e não porque fosse ali na intenção de a escrever.
Afora isso, sendo ela ainda uma tentativa, oxalá que possa vir a escrever mais tarde algo de concreto a este respeito, fruto de mais demoradas observações...
São Vicente de Cabo Verde
Maio-Junho1932»
Capa de F. Torres |
Não conhecia esta monografia de Manuel Lopes. O Djack está sempre a surpreender-nos com coisas novas ou que ignoramos.
ResponderEliminarVejo aqui que o autor confessa, na sua nota, que "fora isso, sendo ela ainda uma tentativa, oxalá que possa vir a escrever mais tarde algo de concreto a este respeito, fruto de mais demoradas observações..."
Pois sim, deduzo que esta obra é uma pincelada a traço grosso, e à flor da emoção, quando o autor visitou o lugar do Paul, S. Antão. Creio que cumpriria a promessa "mais tarde", “com algo de concreto”, quando escreveu o romance "Chuva Braba". Mas aqui já não inebriado pelo som cristalino das águas cantantes das ribeiras, mas tolhido pelo drama da seca que levou o camponês Mané Quim a enfrentar o dilema de ou aceitar o convite do padrinho e emigrar para a Amazónia, onde a água corre em abundância, ou ficar na companhia da velha mãe a tentar colher o sustento na lavra ressequida e sem vida.
Restará então perguntar o que mais terá pela vida fora prevalecido no imaginário literário de Manuel Lopes: o encanto ilusório de alguns trechos da paisagem cabo-verdiana ou a realidade intratável da terra agreste e sedenta. Creio que ninguém tem dúvida acerca disso.