sábado, 7 de julho de 2012

[0203] EM 1962. BANA, NO TEATRO, EM DACAR (SENEGAL), PELA MÃO DE VALDEMAR PEREIRA

ADENDA: Horas após a inserção deste post, vários amigos (sobretudo portugueses) nos perguntaram o que é isso de "guarda-cabeça". Trata-se de uma tradição cabo-verdiana que consta de uma cerimónia contra o mau-olhado e tem lugar na noite que vai do sexto para o sétimo dia, após uma criança ter nascido. Quel cosa d'spantá bruxa... Esta tradição tem equivalentes, com múltiplas variantes, em outros locais em todo o mundo. Em Portugal, por exemplo, ainda há quem  ofereça um filho pequeno à Lua, para evitar  problemas futuros, sobretudo de saúde.

Prometido é devido. Aqui vai o testemunho daquela que parece ter sido a única passagem de Bana pelo teatro. A coisa aconteceu em Dacar, pela mão do pai do teatro cabo-verdiano de diazá, Valdemar Pereira. E a stóra vem contada em "O teatro é uma paixão", da autoria do mesmo Val, nosso colaborador e amigo (ed. de autor, Almada, 2001). O livro teve lançamento em 8 de Maio de 2010 em Lisboa, na Associação dos Antigos Alunos do Ensino Secundário de Cabo Verde numa sessão memorável que o PRAIA DE BOTE apresentou e que teve a presença de Adriano Lima que de igual modo disse interessantes palavras. Também estava no local o pai do teatro cabo-verdiano moderno, João Branco - que apresentaria o livro meses mais tarde, em S. Vicente. Leiamos então a parte alusiva a Bana (com ligeiras adaptações) e vejamos as fotos.

«O sketch baseava-se num ritual de guarda cabeça, a decorrer num lugar imaginário, algures em Monte Sossego. A intenção era fazer do Bana uma das figuras centrais para em dado momento final dar-lhe asa para soltar a sua portentosa voz. Mas tudo começa com a concepção de um entretenimento em qua as pessoas e as peças materiais do ritual estão a postos. Mas aconteceu que houve falta de presença do Bana. No que tocava ao rapaz, solicitado por causa da sua arte, era por vezes difícil acertar-lhe com o paradeiro. Assim, as rezas, as ladainhas, as vigílias, enfim tudo o que fazia parte da praxe do guarda cabeça funcionou e aprontou em devida altura, mas... faltava chegar o homem  que ia animar a festa antes do cuscuz a que todos tinham direito.

Cena do sketch "guarda cabeça", escrito por Valdemar Pereira, com Grigol, Bitim, Octávio, Fefa, Alice, Valdemar (em pé), Bia Gata (deitada) e Bana a interpretar o seu próprio papel
(...) Até que finalmente o nosso homem apareceu, sorridente, mas incapaz de reagir às minhas brincalhonas intervenções, o que é compreensível dado que não tinha então qualquer traquejo para o improviso. Então eu provoquei-o, insinuando que ele estava com vergonha de falar por ter sido apanhado a jogar batota no sótão do Derby, ao que a plateia ripostou no mesmo tom de boa disposição, dizendo que não senhor, ele não jogava, não bebia, havia sim muitas "pequenas", isso sim senhor, que andavam atrás dele e não lhe davam tempo para nada, etc.»

Cena com Valdemar Pereira (à esquerda), Bana e Fefa Matos no Théâtre du Palais, Dacar, 8.10.1962

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